Cascalho, direita.
Ele se define como um homem inquieto, ao tentar explicar o que o levou a se formar no curso de jornalismo da Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul, PUC, em 1975, e como se tornou o comunicador que marcou uma época. Hoje o jornalista Antonio Carlos Contursi ainda se emociona ao lembrar da infância vivida entre as redações dos jornais e os passeios de pedalinho no Parque da Redenção. O pai era repórter fotográfico, e com ele Cascalho, como todo mundo o conhece, frequentava a Prefeitura, o Palácio Piratini e as redações dos jornais.
Cascalho acha que é devido à ascendência italiana que o pai sempre fez questão de que ele tivesse contato com as origens, levando-o a passear na Serra gaúcha, um dos berços da colonização italiana. “Meu pai para mim foi mais que um pai, foi um homem extraordinário”, diz, acrescentando que sempre uniu a participação nas empreitadas jornalísticas do pai com as brincadeiras realizadas nas proximidades da antiga Assembleia. “Eu brincava muito perto da Assembleia, pois tinha uma tia que morava próximo e então eu fiz amigos por ali. Sempre fui um menino muito ativo, muito de rua, eu era endoidecido”, relembra. Eram brincadeiras que se estendiam também para a rua Olavo Bilac, onde morava e onde ganhou o apelido de Tonico. Buscava pneu e madeira para fazer fogueira, curtia a rua, gostava de brincar de bolinha de gude, de jogar taco. Isto é, foi sempre uma criança bastante ativa, característica que o quase sessentão – ele nasceu em 30 de dezembro de 1949 – ainda carrega.
Já nesta época era um apaixonado pelo rádio. E gostava muito porque o rádio carregava emoção, inclusive nos programas de humor que vinham da Rádio Nacional de São Paulo e do Rio de Janeiro, e depois os que eram adaptados aqui pelas rádios Gaúcha e Farroupilha. Nesta época, Tonico conseguia imaginar o que os radialistas tentavam passar. “Como não tinha imagem, eu usava a imaginação para identificar o que estavam interpretando. Ou seja, uma forma criativa que já me acompanhava desde a infância”.
Em 1958, quando começaram as transmissões esportivas de rádio pela Guaíba, na Copa do Mundo da Suécia, novas inspirações agitaram o garoto. “Eu ouvi aquele som que até hoje me emociona, aquele som que vinha através de um rádio chamado SSB, uma transmissão fantástica por uma frequência de rádio, então eu pegava uma xícara de café, colocava na boca e imitava aquele som abafado”.
O comunicador da juventude
O começo da carreira foi como estagiário na Rádio Gaúcha, atuando da técnica à reportagem. “Eu peguei uma época muito rica, quando o Maurício Sirotsky Sobrinho fez uma renovação na rádio e criou o departamento de esportes. Esta foi uma experiência importante para minha formação. Eu tive a sorte de pegar tudo no inicio, toda a origem, o que foi uma grande escola”. Na época, com apenas 17 anos, o jovem tinha ânsia de vencer. Gostava muito de ouvir música e, bom observador, registrou que as rádios não tinham programas de música direcionados ao público jovem. Daí a decisão pela criação de um programa jovem: “Eu sabia que se isto acontecesse, eu arrasaria”.
A intuição do ainda adolescente deu certo, e em maio de 1970 já estreava o programa ‘Bier Show’, na Rádio Continental. Após dois anos, a atração passou a se chamar ‘Cascalho Time’ – e foi aí que o programa alavancou. Cascalho se transformou num ícone da geração dos anos 70. “Foi uma revolução este programa, eu criei uma personagem louca, que gritava e tinha uma voz rouca, como uma anarquista. Até então, o rádio não tinha nada disto”.
O programa tinha um ritmo alucinante para a época, tocando uma música atrás da outra, com o personagem encarregando-se de levar emoção para o ouvinte. “Eu fazia mais ou menos o que minha imaginação pensava lá quando eu ainda era pequeno, tentava fazer com que os ouvintes ficassem imaginando como eu era. E dito e feito, os ouvintes me imaginavam gordo, sujo, com calça Lee esfarrapada, de chinelo de couro. Mas não era nada disso, eu era até meio Mauricinho”.
A partir disso, o filho mais novo de Irene Galante Contursi e do jornalista Carlos Cunha Contursi ficou conhecido pelo nome artístico, Cascalho, apelido que recebeu na praia de Capão da Canoa. “Eu era um italiano muito clarinho, minha mãe raspava o meu cabelo bem curtinho e então apareciam as minhas orelhas de abano. O sol me deixava com a pele vermelha, então um menino começou a dizer que eu parecia um cascalho” – apelido que colou, talvez porque o menino ficava furioso a cada vez que era chamado assim. “Mas hoje agradeço e sou reconhecido por Cascalho”, resigna-se.
De Tonico a Cascalho, o certo é que o comunicador teve uma influência forte sobre a formação da juventude porto-alegrense da época. Criou o ‘Baile dos Magrinhos’, que eram festas populares de jovens, nos anos 70. Aos finais de semana, Cascalho lotava os clubes com cerca de três mil pessoas, ao som dos DJs da época, que eram naturalmente chamados de disque-jóqueis mesmo. Assim viajou por este Rio Grande do Sul afora, e graças a este agito as portas da televisão se abriram para ele.
Começou no Jornal do Almoço, na fase, como diz, “colorida” da televisão gaúcha. Depois foi para a TV Difusora, atual Band TV RS, com o programa Porto Visão, e no início dos anos 80 participou da inauguração da TV Guaíba – sempre com programa direcionado ao jovem, sempre tratando de música.
Em mais uma missão pioneira e inovadora, ele fundou em 1979 a VTR, a primeira produtora de vídeo independente. “A TV Guaíba foi inaugurada, com Câmeras minhas, pois a importação das câmeras portáteis deles não tinha chegado ainda, e eu fui contratado pela Caldas Júnior para isto. Este foi um fato muito marcante para mim”, faz questão de registrar.
Em seu currículo ainda constam um cargo de diretor da Companhia Estadual de Energia Elétrica do RS (CEEE), a participação como fundador da Companhia de Gás do Estado do RS (Sulgás), a propriedade da Rádio Sucesso e uma candidatura frustrada a deputado estadual, em 1990. “Gostaria de ter feito muitas coisas, mas não me arrependo de nada do que fiz”, garante. “Tudo o que fiz, eu fiz porque queria fazer”.
O refúgio em casa
Está casado há 33 anos com Maria Amélia, com quem tem três filhos: o advogado José Vicente, 30 anos, a gerente da Dell Computer Fernanda, 28, e a administradora Carolina, 25.
Depois que se mudou, em 2002, para a casa na beira do Guaíba, na Ilha da Pintada, sossegou um pouco, como ele mesmo diz. “Depois que construímos a casa nos tornamos mais caseiros, mais comodistas. Preferimos acender a lareira e beber um vinho do que sair”. Nos finais de semana, passeios de lancha, jet esqui e churrasco animam a programação da família. Este contato com a água, seja de mar ou de rio, tem um duplo efeito sobre Cascalho: “Ao mesmo tempo em que me acalma, me excita”. É o que diz.
Apaixonado por carros antigos, ainda sonha em ter uma destas relíquias. “Gosto muito de ver pela internet ou em revistas. Eu ainda irei me realizar tendo um ou dois destes carros placa-preta. É um sonho, pois vejo me dirigindo um carro antigo e isto é como se eu voltasse no tempo”. O desejo de igualdade é outro sonho que o marca: “Eu gostaria que todo mundo fosse igual, não gostaria que por isso me rotulassem como um socialista, mas que no mundo não existisse pobreza. Que todos tivessem sua moradia, acesso a transporte, saúde, que fosse tudo muito planejado”.
Por uma nova revolução
Hoje, Cascalho voltou a ser o Antonio Carlos Galante Contursi, cidadão que atua na Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre, onde faz captação de tênis novos e usados junto à comunidade, e os distribui para jovens carentes. É o projeto Banco do Tênis, liderado pelo secretário e também jornalista João Bosco Vaz. Também participa como convidado do Programa Atividade, na Ulbra TV, onde faz um contraponto com o apresentador e com um convidado.
Agora mais experiente e renovado, Cascalho acredita que está faltando uma revolução na comunicação para voltar a trabalhar com rádio ou televisão. “Estou aguardando uma oportunidade para voltar para uma segunda fase da minha vida, daquilo que eu fui, revolucionando o rádio jovem, para hoje, onde já tenho uma trajetória, uma experiência. Estou esperando um momento de ascensão para assumir algo que possa ter uma repercussão semelhante à da minha época do rádio, pois posso afirmar que alguma coisa está faltando”.
Enfim, ele acredita que pode, sim, ser muito útil, e anseia por voltar a sentir que pode contribuir para alegrar e divertir o público. “Seja de uma forma séria ou brincalhona, acredito que isto é que está faltando”, afirma, com convicção. (Coletiva)