sábado, junho 21, 2008

Um atentado aos nossos ouvidos

Rodaika: que vozinha...

Voz, na televisão, é tão importante quanto a imagem - mas parece que isso não vale no nosso Estado. Ligue a tevê e confira: no Jornal do Almoço tem aquela Rosana não sei do quê: a moça, além de não ser nenhuma miss, (até aí tudo bem) parece que fala pela barriga, ou que tem uma batata quente entalada na boca. Na TVCOM, Canal 36, a coisa é ainda pior: uma menina que tem o exótico nome de Rodaika (parece marca de pneu) apresenta uma voz tão esganiçada, tão aguda, que nem dá pra chamar de voz e sim de cacofonia. E um outro garoto, que apresenta o programa Patrola, na RBS, simplesmente agride os nossos ouvidos - na minha opinião, ele e essa Rodaika são as vozes mais belas da televisão brasileira. Eles e o Jerry Lewis.
Porém, o pior mesmo é quando a gente fala do tempo. Hoje, os meteorologistas estão com tudo, são quase astros da mídia. Pois tem um, de sobrenome Kuhn (deveria ser proctologista), o "homem do tempo", que todo santo dia (deve acordar às 3 da manhã) está nas rádios da RBS, dando o boletim e apresentando suas previsões, sempre usando o "eu" para tudo. Bom, esse sujeito é o cúmulo, e a gente não sabe se dá risada ou desliga o rádio - comparativamente, o som que ele emite é parecido com os guinchos dos babuínos do Quênia quando estão melindrados ou ofendidos - vou usar essa figura na falta de outra pior.
Admiro dois tipos, nesses casos - os que têm bons dentes e os que têm boa voz. Acho, entretanto, que esse pessoal de televisão e do rádio deveria passar antes pelo consultório de uma fonoaudióloga, para educar a voz e não agredirem tanto os telespectadores. No meu tempo de guri, diziam que, pra engrossar a fala, a gente deveria comer giz. Demóstenes, o grego, o falastrão, um tribuno do porte do Pedro Simon (verdade!), era gago de nascença, mas aprendeu a falar direitinho colocando pedrinhas na ponta da língua e fazendo discursos para as ondas do mar:"Trabalhadores atenienses!". Fácil assim. (Conselheiro X.)

O cinzento do primeiro dia de inverno

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Foi um sábado cinzento, com cores cinza, céu fechado, e um vento que tornou a sensação de frio - em torno de 10 graus - ainda mais intensa. O primeiro dia de inverno realmente teve a cara da estação. Poucas pessoas saíram às ruas - a maioria preferiu ficar em casa. Veja nestes flagrantes como estava o Jardim Botânico na tarde de hoje.

Agenda


* O Museu de Ciências e Tecnologia da PUC está abrindo espaço para a realização de festas de aniversário onde será possível apreender brincando. O Aniversário Genial, como está sendo chamado, conta com uma equipe especializada, composta por monitores que acompanharão o grupo nessa aventura de descobrimentos. São oferecidos convites personalizados para os convidados, um cartão especial parabenizando o aniversariante, espaço para a realização dos lanches e shows em horários alternativos, de acordo com a necessidade do grupo. O agendamento é feito com antecedência, de segunda a sexta-feira, das 8h às 18 horas, pelo e-mail relacionamento.mct@pucrs.br ou pelo tel.: 3320-3521.
A festa pode ser realizada de terças a domingos, das 9 horas às 17, dias e horários de funcionamento da exposição do Museu.
* O Programa de Pós-graduação em Zoologia da Faculdade de Biociências da PUC-RS recebe inscrições, até 27 de junho, para o processo de seleção para os cursos de Mestrado e Doutorado.
O edital e o formulário de inscrição estão disponíveis napáginaww.pucrs.br/pos/zoo. Informações no segundo andar do prédio 12, ou tel.: 3320-3568, ou zoologia-pg@pucrs.br
* Seminário Economia às 5 e meia. Com André Cunha, professor do Programa de Pós-Graduação em Economia da UFRGS. Tema: A Crise nos EUAe Suas Repercussões na Economia Mundial. Nesta segunda-feira, 23, às 17h30min, na sala 814 do prédio 50 da PUC (avenida Ipiranga). Entrada franca. Informações: 3320-3524.
* Ciclo de Palestras História e Historiografia: Breves Reflexões. Palestra "O Mundo às Vésperas da Grande Guerra (1850-1914)", com o professor Helder Gordim da Silveira, coordenador do Programa de Pós-Graduação em História. Dia 24, terça-feira, das 17h45min às 19 horas, no auditório do Prédio 5. Será arrecadado 1 kg de alimento não-perecível.
* Extrato da Biblioteca por E-mail. Desde o último dia 16 as bibliotecas da PUC-RS oferecem o novo serviço de extrato por e-mail. Sempre que forem feitos empréstimos no balcão de atendimento, o extrato do usuário será enviado por e-mail para o endereço registrado previamente, relacionando todos os empréstimos em poder da pessoa e suas respectivas datas de devolução. Os empréstimos e datas de devolução também podem ser acompanhados pelo site http://verum.pucrs.br/ALEPH, clicando na opção usuário.
* Viagem ao Chile. A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da PUC promove a viagem de estudos "Arquitetura Contemporânea Chilena". A atividade inclui visitas a obras de arquitetura nas cidades de Santiago e Viña del Mar. A arquitetura recente do país é considerada uma das melhores do mundo. Podem participar estudantes e professores de arquitetura e arquitetos em geral. As inscrições podem ser feitas até o dia 26 (Quinta-feira), na Pró-Reitoria de Extensão (prédio 40). A viagem ocorrerá de 10 a 16 de outubro. Informações pelo Tel.: 33203680 ou proex@pucrs.br

Baú do Conselheiro: Camila Pitanga aos 16 anos

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Camila Pintanga, hoje com 30 anos, e mãe de um filho, já parava o trânsito aos 16. Na edição de 26 de janeiro de 1994 da revista Veja - há 14 anos, portanto - a filha de Antonio Pitanga aparecia em uma pose sensual e já prometia ser o que é: a gostosona não-burra, bem estilo brasileiro, que faz todo homem babar. O título já diz tudo: De dar água na boca. (Arquivo do Conselheiro X.)

sexta-feira, junho 20, 2008

"Muitas Ondas": local de livros, café e cultura

Mara: "A cultura é a minha área".Livros e revistas para alugar. Brinquedos e jogos para crianças e adultos. Café capuccino, refrigerantes, cerveja, suco, crespes, doces e salgadinhos - além de um karaokê e, na área externa, um mini-golf. E, sobretudo, um ambiente agradável e aconchegante, com segurança, e extremamente bem localizado: está ali, na rua Felizardo, 351, entre a Guilherme Alves e a Barão do Amazonas.
Este é o "Muitas Ondas", uma locadora de livros e revistas (além de jogos) que funciona há três anos no Jardim Botânico e já tem um cartel de mais de 200 clientes - muitos deles fixos e, a maioria, moradores do próprio bairro. "O pessoal do livro é muito fiel", explica a proprietária, a professora Nilta Mara Severo Freitas - que, entre outras coisas, também é autora de um livro infantil.
Trabalhando a portas fechadas (é preciso apertar a campainha na calçada), o Muitas Ondas é a única locadora de livros e revistas do Jardim Botânico. Pequeno - não mais que 8o metros quadrados - com banheiro, atrai pessoas interessadas em cultura ou que simplesmente vão ali para conversar e trocar idéias - o que pode ser temperado por um bom café. São quase três mil títulos - a maioria de literatura (há também obras espíritas, técnicas, educativas), com destaque para os lançamentos e os best-sellers do momento. "Tenho a lista dos dez mais vendidos da Veja, e compro todos os lançamentos", informa Mara, uma professora de Artes aposentada do Estado (mas trabalhando pela Prefeitura). "A cultura é minha área, e gosto porque aqui convivo c om gente interessante", diz ela.
LIVROS PRÓPRIOS - Mara iniciou o sue negócio com os próprios livros de sua biblioteca, mais os de sua mãe - e, aos poucos, foi comprando mais e mais, e também ganhando doações. Sem fazer muito alarde do negócio - a coisa funciona mais na propaganda boca-a-boca - ela montou a sua locadora, que, conforme diz, "funciona em horário emocional", muito embora esteja quase sempre aberta - o horário vai das 10 horas às 22 horas, de segunda a sábado.
Gradualmente foi conquistando o seu público - que só não é maior pois tanto ela quanto o marido, o corretor de imóveis Ângelo - fazem questão de manter a segurança em um bairro (assim como todos os demais) de crescente violência.
"A segurança é fundamental, e muitas mães deixam os filhos aqui, brincando e lendo, enquanto fazem outras coisas", afirma. Se trabalhasse sem grades, de portas abertas, a freguesia certamente iria aumentar.
O "Muitas Ondas" não tem somente livros, café, jogos, ou lanches: há muitas peças de artesanato nas prateleiras, todas à venda, o que dá ao ambiente um toque especial. No verão, muitas pessoas - especialmente mulheres e casais - sentam-se nas mesas do pequeno pátio para saborear algum suco ou uma cervejinha, degustar doces ou salgadinhos e, é claro, jogar uma conversinha fora - se for sobre livros, melhor ainda.
"Tenho muitos clientes no Conjunto da Felizardo, e isso que não fiz propaganda por lá ainda", garante ela. No inverno, que hoje inicia, o "Muitas Ondas" (que ganhou esse nome em homenagem ao mar de Cidreira) se torna ainda mais agradável e aconchegante, e é uma boa pedida para a época de frio. O público é de todas as idades - há senhoras de mais de 70 anos, em busca de um determinado livro, e crianças de seis ou sete anos divertindo-se com jogos ou procurando obras infantis, inclusive gibis.

SERVIÇO:
Muitas Ondas - Rua Felizardo, 351
Tel.: 3061.4753 - 9153.6293
Horário: 10 hs às 20 horas, de segunda a sabado.
Preço da locação do livro: R$ 0,40 (diária)
Requisitos para locação: documento de identidade, CPF e comprovante de residência (contas de luz, telefone, água, carnês)

Apesar do tempo, será noite de sexta-feira

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A sexta-feira é de chuva fina e tempo totalmente fechado no Botânico - aliás, em toda a Porto Alegre. Não dá pra dizer que é um daqueles belos dias de outono, como se vê - a umidade faz o frio se tornar mais intenso.
É o tipo de clima que os motoqueiros de tele-entrega adoram: um vacilo no asfalto e créu. Pelo visto, vai continuar assim nos próximos dias.
É, mas é sexta-feira (o Inverno entra oficialmente esta noite), e o pessoal vai cair na gandaia. Com um tempo desses, o bom mesmo é pegar um barzinho com ambiente intimista - se tiver lareira, melhor ainda.
Pouco tempo atrás o Jardim Botânico era totalmente carente nessa área. Mas, agora, com o progresso (sempre ele), temos algumas boas opções: dois pubs - aquele da Serafim Terra, bem aconchegante, e o da Felizardo, mais amplo, recentemente reinaugurado, com música ao vivo para quem gosta, e dois ambientes.
A garotada prefere o Cavanhas, na Barão do Amazonas, e outros o treiller da Tia Zefa, ali perto. Mais popular, o Bora-Bora continua com a sua clientela, até altas horas da noite. Mais caro e família, o Bambino, na Terceira Perimetral, é outra boa pedida, assim como a churrascaria do 35 CTG, ao lado do Bourbon, com suas simpáticas mesas de madeira e shows de dança e música.
Falando em Bourbon, tem lá o restaurante Calamares e o Doce Pecado (será que não errei o nome?), bem ali na entrada, além das opções da praça de alimentação. Noite boa, aliás, para pegar um cineminha. Ah, e tem o Stúdio, na rua Itaboraí, número mil e poucos, além dos lanches do Cláudio Lanches. Na Salvador França, está o André, com o seu Fome Zero.
Como hoje é dia 20, e ainda restam dez ou onze dias para o final do mês, o pessoal deve estar meio encolhido nos gastos, esperando sair o pagamento. Mesmo assim, sempre dá para se fazer alguma coisa. Nem que seja no motel Sherwood ou no A2, do outro lado da Ipiranga, entre a Barão do Amazonas e a Guilherme Alves.
E, para colocar alguma coisa bonita e sensual ilustrando essa matéria, vamos entrar no túnel do tempo e voltar ao mês de novembro de 1992 - quase 16 anos atrás, tempo em que Collor ainda era o presidente do Brasil. Quem encontramos? Luana Piovani, uma garotinha de 16 aninhos, que mal despontava para ser musa (estreava na tevê) e ainda não era tão metidinha como hoje (chamou caetano Veloso de "banana de pijama"...). A matéria é da revista Veja de 25 de novembro daquele ano, cuja capa era uma entrevista exclusiva com Madonna, então vivendo o seu auge e dizendo que gostava "de apanhar e levar tapas" - na cama.
Bom final de semana a todos.
* Atualizando: agora, no início da noite, o céu abriu quase completamente, o vento castiga a todos e o frio se faz mais intenso. Duvido que chova amanhã - se é que é possível prever alguma coisa nesse nosso clima.

quinta-feira, junho 19, 2008

Fome Zero: ponto de referência

Trabalhar na Terceira Perimetral, à noite, não é para qualquer um. Com o aumento da violência, os comerciantes da avenida Salvador França andam precavidos e fechando cada dia mais cedo.

Inaugurado em 9 de abril de 2003, a lanchonete e restaurante Fome Zero - ali, perto da rua Surupá - é um dos pontos de referência no comércio do local.

O proprietário do Fome Zero é uma figura conhecida do bairro, onde está há 30 anos - André Notti Miranda. Comerciante por vocação - está nesse ramo desde os 18 anos - André não reclama do movimento (vende, em média, cerca de 100 almoços diários). Aberto de segundas aos sábados, das 10 às 24 horas, ele trabalha ao lado da esposa e tem mais três funcionários para auxiliá-lo. O público que frequenta o Fome Zero é formado, basicamente, por trabalhadores de empresas das redondezas e moradores do bairro.

"Ter um comércio na Terceira Perimetral tem vantagens e desvantagens", diz. "A vantagem maior é o movimento. Por outro lado tem o barulho, a falta de acesso para os carros, que passam batidos, e a violência". A respeito dessa última, André confirma: "A chinelagem aumentou em 100%, todo dia dá alguma coisa, ontem mesmo deu tiros aqui perto".

Antes de abrir o Fome Zero, ele teve uma choperia em Rondônio, Estado onde viveu por cinco anos.
Para rodar o filme, clique na seta à esquerda do vídeo

O velho cinema Pirajá: casa de tintas


Na época área dos cinemas de bairro - que foi dos anos trinta aos meados dos anos setenta - o cinema Pirajá, na avenida Bento Gonçalves, um pouco adiante da rua Luis de Camões (ao lado do atual Arquivo Histórico Municipal), foi um dos preferidos dos moradores do Jardim Botânico, assim como o cinema Miramar.

Ao contrário de tantas outras casas de exibição, o cine Pirajá mantém a sua fachada - ou seja, ao menos existe fisicamente. Lá, agora, funciona um comércio de venda de tintas e material de construção.

O Botânico nos anos 60: quase rural

Outro antigo morador do bairro (embora não tenha nascido aqui) é Rui Cintra, de 56 anos, dono de um pequeno bar nos fundos do Supermercado Gecepel, na Guilherme Alves. Suas lembranças remontam aos anos sessenta, quando o bairro era formado por casas de madeira, chácaras, plantações de agrião e de flores, a Guilherme Alves e a Barão do Amazonas eram ruas de chão batido, com esgotos a céu aberto que corriam livremente às margens das vias.
“A Guilherme Alves não tinha nem saída, ia-se até a Valparaíso e do outro lado era um banhadal. Em volta do riacho havia um monte de malocas e uma ponte de madeira que dava passagem para o Campo de São Pedro, que é hoje a Vila Cachorro Sentado”, conta ele, recordando que ainda se tomava banho e se pescava no Arroio Dilúvio, especialmente a montante, nas alturas de onde hoje é a PUC. “Lá existia uma ponte de madeira e famílias inteiras iam lá, passar o dia, tomar banho, tinha muita areia ali”.
Por essa época o local onde hoje está o Conjunto Residencial Felizardo Furtado existia a Chácara Nossa Senhora do Caravaggio, provida de uma pequena vertente, o chamado “parquinho”. Seu Rui recorda de muitas outras do mesmo tipo – a chácara do seu Zé, dos Pieretti, das Camélias. Acima, mais adiante havia o campo do Sul Brasil. Diferentemente de hoje, as ruas nem sempre levavam a outras ruas. “A Salvador França, por exemplo, só ia até a Felizardo, depois era mato, para se ir à Protásio se seguia pela Tibiriçá, onde hoje está o posto de gasolina do Darci”, afirma ele.
Em meados dos anos setenta, quando se iniciou a construção dos blocos residenciais, vieram milhares de trabalhadores, muitos deles provenientes do interior do Estado – e isso modificou totalmente a paisagem do bairro. “Antes todo mundo se conhecia e se cumprimentava, quando chegou essa turma mudou tudo, a rua Felizardo encheu de gente indo e vindo, virou quase uma rua da Praia”, rememora Rui.
Desse período merece destaque o bar da Dona Tida (da família dos “Bravos”), uma antiga moradora, já falecida, que adaptou a sua casa de madeira, na Felizardo (onde hoje está uma creche), e a transformou em bar e restaurante, com mesas de sinuca, venda de bebidas e refeições disputadas pelos trabalhadores da obra. “De vez em quando dava confusão ali”, informa. Já havia, então, o armazém dos Mocelin e, mais adiante, na esquina com a Barão, o do seu Alécio. Para aumentar a renda, aproveitando a vastidão dos terrenos, algumas famílias faziam puxados e alugavam pequenas peças que serviam de moradia os trabalhadores.
ANOS SESSENTA – Quem viajasse no tempo e retornasse aos anos sessenta e início dos setenta no Jardim Botânico encontraria um bairro quase rural, com um reduzido número de prédios e estabelecimentos comerciais. Já havia, é certo, um posto de gasolina na Barão com a Valparaíso (continua a existir) e também uma padaria (Barão com Felizardo), no mesmo local e no mesmo prédio em que há uma hoje. “Do outro lado, na Felizardo, havia um campinho de futebol, muito usado pela turma dos Bancários”, recorda seu Rui. “Na esquina da Barão com a Itaboraí havia o comércio do seu Antonio, relativamente forte. Tinha também o seu Edu e dona Maria. E onde hoje está o Bora-Bora era um terreno, um comércio onde se fazia argamassa que muita gente vinha buscar de carroças. Do outro lado era um comércio forte, o armazém do seu Caboclo.
Uma curiosa indústria que existia na época tinha muito a ver com o bairro – uma fábrica de artefatos para cavalos e carroceiros localizada na Guilherme, defronte à atual igreja de São Luís, e que produzia não somente carroças como ferraduras. “Era do seu Lúcio. Ele era, por assim dizer, o industrial da ferradura e se dava bem porque aqui tinha muito carroceiro e muitos cavalos. Tinha vários empregados e foi a nossa primeira montadora, muito antes da GM”, recorda, divertido, seu Rui.
Nesse mundo tão pequeno, o lazer era igualmente simples. “Na Semana Santa se passava filmes em um bar da Valparaíso com a Salvador, se colocava um grande pano branco na parede e todo mundo se reunia para assistir filmes religiosos”. Os cinemas mais próximos eram o Ritz, o Miramar e o Brasil, este último próximo ao Partenon Tênis Clube, onde atualmente está um posto de gasolina.

A vantagem de ser distraído

Se o sujeito é distraído, ele sofre muito - como todo distraído sabe muito bem, especialmente naquela hora da madrugada, quando se volta pra casa e se procura a chave da porta - cadê ela? Onde é que deixei?
Pois é, mas eu conheci uma pessoa - grande amigo, que, aliás, já se foi - cuja distração o salvou de uma grossa enrascada.
Pra começo, devo dizer que ele era, fisicamente, do tipo do Bill Gates: cabelinho eriçado para cima, um certo ar intelectual, calmo, simpático (isso o tornou um grande vendedor de anúncios) e, sobretudo, um óculos de grau 12 nos olhos, o tal "fundo de garrafa". Grau 12 é soda, é uma quase cegueira, se vê (imagino eu) tudo embaçado e fora de foco e até atravessar uma rua pode se transformar uma séria dificuldade.
Um dia esse meu amigo estava jantando em uma pizzaria ali perto do Hospital de Clínicas, na companhia do seu irmão. Era noite e a casa estava quase cheia - eles lá, em um canto, conversando e bebendo uma cerveja.
Acontecia da mesa deles estar localizada de frente para a porta de entrada. Uma hora, meio para o final da noite, entraram três sujeitos - e esse meu amigo, que chamávamos de Moquinho (diminutivo de Mocorongo) levantou os olhos, distraidamente, olhou o cidadão e, sabe-se lá porquê - no meu entender, por distração, ou porque pensou conhecer o sujeito ou ainda porque ele era gente boa - cumprimentou-o com um "e aí?", fazendo o gesto de positivo com o polegar.
A conversa deles continuou normalmente, regada por uma bebidinha, até que, uns quinze minutos depois, os três fregueses que haviam chegado sacaram as armas e anunciaram: era um assalto. Foram até o caixa, recolheram tudo o que havia para recolher e, depois, passaram a percorrer as mesas, de armas em punho, saqueando todos os pertences da clientela.
Nessa hora Moquinho e seu irmão se tocaram que estava acontecendo um assalto - e que todos, inclusive eles, teriam de entregar tudo para os bandidos. Calmamente, foram retirando carteira, relógio (celular não, porque isso aconteceu há mais de 10 anos), documentos, e colocando sobre a mesa, conforme os caras ordenaram.
Quando um dos assaltantes chegou à mesa dos dois, para pegar o que tinha, o outro - o que era o chefe e que meu amigo havia cumprimentado, sem nunca ter visto mais gordo - interveio e ordenou ao comparsa: "Esses aí não, esses tão liberados". Em seguida, deram no pé e nunca mais foram vistos - foi, como se vê, um assalto bem sucedido.
Penso nisso e dou risada toda vez que me lembro. E não deixo de considerar que aqueles bandidos foram gentlemans, verdadeiros cavalheiros da ordem da bandidagem, agiram como profissionais no sentido mais lato da palavra. Provavelmente o chefão deles considerou que aquele gesto com o polegar, de positivo, lhe trouxe sorte (e acho que trouxe mesmo) e que meu amigo, no fundo, era mesmo um cara simpático - e era. Quer dizer, por causa de um simples cumprimento, de um gesto civilizado, Moquinho e seu irmão foram os únicos a escapar da pilhagem, os únicos que não perderam nada. Vejam só como a distração às vezes pode ser uma grande qualidade.
Já a direção da pizzaria, imagino, ficou com a pulga atrás da orelha em relação aos seus dois fregueses. Quem sabe lá não estavam coniventes com os assaltantes e foram ali para sacar qual era a do ambiente? Bom, o certo é que os dois irmãos nunca mais voltaram
lá. A sorte dificilmente bate duas vezes à mesma porta. (Conselheiro X.)

quarta-feira, junho 18, 2008

A Pré-História do E-mail

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O e-mail - ou correio eletrônico - praticamente substituiu as cartas comuns que todos nós, uns tempos atrás, mandávamos para os mais variados cantos do país e do Mundo - e que, além de exigir selo (e dinheiro), demoravam um bocado para chegar.

É, mas a gente não lembra direito de como tudo isso começou. Simplesmente parece algo normal, como beber um copo de água, só que não é bem assim.

Vejam nesta matéria que o Conselheiro X. descobriu em seus alfarrábios, datada de 17 de fevereiro de 1993 (pouco depois do impechment de Collor), na revista Veja - quinze anos atrás, portanto. Não faz muito tempo - e tudo mudou tão radicalmente que a gente nem consegue imaginar como era a coisa em seu início, e tinha apenas 2 mil usuários. Digamos que era algo exclusivo do meio universitário - dos professores e pesquisadores de universidades - e havia custos, sim. A Internet engatinhava, àquela época - sabem o que é Brasnet? Acompanhem.


"Conversa Digital


"Através de uma rede de correio eletrônico, cientistas , cientistas brasileiros trocam informações com colegas no exterior"


"Uma nova forma de comunicação está ganhando espaço entre os acadêmicos brasileiros conectados com a era da informática. Mais veloz que o telex, mais confiável que o fax e tão fácil de usar quanto o telefone, em todo o mundo esta nova mania se chama correio eletrônico. Ela permite o intercâmbio de correspondência digital e informações entre pesquisadores. No ano passado, a Brasnet, o braço brasileiro da Internet, a maior rede mundial de computadores, cresceu quase 500%, elevando a 2 000 o número de computadores nacionais ligados ao sistema. Na Internet, há mais de 1,3 milhão de computadores conectados. Eles trocam mensagens e programas entre si utilizando canais de transmissão de dados e via satélite. Todas as universidades americanas fazem parte do sistema, bem como a maioria dos centros de pesquisa europeus. Cada máquina possui um endereço eletrônico, para o qual são enviadas cartas e mensagens.

"A vantagem para os pesquisadores brasileiros conectados ao correio eletrônico é que o computador se transforma numa ágil ferramenta de comunicação com o mundo e deixa de ser apenas uma máquina eficiente mas isolada. "Antes eu era obrigado a esperar mais de um mês para obter uma resposta por escrito de um pesquisador do exterior a fim de tirar uma dúvida", diz o professor Imre Simom, do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo, um usuário frequente da Internet. "Com o correio eletrônico, me comunico rapidamente com o exterior e, em um dia ou dois, alguém me manda uma carta digital com a solução do problema". Um dos mais assíduos correspondentes eletrônicos de Simon é o francês Christian Choffrut, professor do Laboratório de Informática Teórica e Programação da Universidade Paris VII. "Através do correio eletrônico, trabalhamos como se estivéssemos um ao lado do outro", disse Choffrut a Fábio Altman, correspondente da VEJA em Paris.

"A primeira providência de Choffrut quando entra na sua sala na universidade é verificar se há alguma correspondência eletrônica em seu computador. "É como se estivesse consultando minha secretária eletrônica", diz o francês. Mesmo de casa, Choffrut consegue ter acesso às mensagens enviadas a seu computador instalado na universidade. Ele aciona o seu Minitel, o serviço de videotexto francês, que funciona através da linha telefônica convencional, e "entra" em seu micro na escola em busca de alguma carta digital.

"Além de mandar mensagens individuais, o sistema também permite o envio de correspondências coletivas. Os bolsistas brasileiros no exterior se comunicam através do Brasnet. Eles escrevem uma mensagem e, em vez de endereçá-la para apenas um usuário, mandam a carta digital para a Brasnet, que envia uma cópia do texto para os cerca de 1 500 associados a essa pequena rede nacional.

IMPEACHMENT - Foi através do Brasnet que, no dia 29 de setembro do ano passado, esses mesmos bolsistas acompanharam a votação do impeachment do presidente Fernando Collor. Os resultados da votação do Congresso Nacional eram veiculados pela rede por pesquisadores brasileiros que acompanhavam o impeachment pela televisão. Além de tratar assuntos sérios, também há espaço para brincadeiras no Brasnet. O cearense Mauro Oliveira, de 38 anos, que faz doutorado na Universidade Paris VI sobre o ensino de rede de computadores, ficou conhecido na rede nacional como "Mauro Pacatuba". O brasileiro difundiu pela Brasnet durante 55 semanas seguidas, sempre às sextas-feiras, a "Rádio Uirapuru de Itapipoca", um programa escrito de humor. A rádio só teve 55 emissões porque Mauro Pacatuba, em certo momento, verificou que o uso lúdico do Brasnet tinha se transformado num vício. "Resolvi parar para me dedicar à minha tese", diz o brasileiro.

"Além da rapidez e da eficiência desse sistema, os especialistas em computação apontam outra vantagem no uso do correio eletrônico. Segundo um estudo da empresa Hewlett-Packard, uma mensagem eletrônica custa bem menos que uma carta ou um fax. A empresa gasta 22 centavos de dólar para mandar uma mensagem de duas páginas pelo correio eletrônico para uma de suas subsidiárias espalhadas pelo mundo. Isso é metade do preço de uma carta internacional e quase oito vezes mais barato que um fax."

Uma do Macanudo Taurino.




Um dos maiores chargistas e cartunistas brasileiros, cheio de prêmios nacionais e internacionais (ganhou até na Bulgária!), Santiago - batizado com o incrível nome de Neltair - fez muito sucesso, tempos atrás, com o seu personagem bagual, o Macanudo Taurino. Republicamos uma dele, sem autorização do autor, é claro.

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Qual o barato dos pichadores?

Pois é. Manhã de um belo sol, poucas nuvens, um frio que está bem melhor do que ontem. E o Jardim Botânico segue no seu ritmo: novos edifícios sendo erguidos, gente que chega, gente que sai, um assalto aqui, um arrombamento ali, um ciclista atropelado, Salvador França a mil - assim caminha a humanidade botaniquense.
Palavrinha estranha essa - botaniquense. Não deve constar em nenhum dicionário, mas é assim que nosso povo - os mais antigos - se chama. Se ainda fosse Vila Russa o nome do bairro, como é que nos chamaríamos? Russos, quem sabe. Ou cossacos.
Caminhando pelas ruas do Botânico - nem todos têm carro, ainda (segundo as estatísticas, dois em cada três porto-alegrenses têm, embora não seja o nosso caso) - constatei um fenômeno (nem tão fenômeno assim) que já havia visto no Partenon: a pichação. Lá, no nosso vizinho, não escapa nenhum prédio. É realmente incrível como esses pichadores são ágeis e onipresentes - e como se arriscam, inclusive a caírem de um segundo ou terceiro andar e quebrarem os cornos na calçada. Mas como são obstinados - esse mérito não podemos lhes negar - conseguem fazer aqueles arabescos imcompreensíveis em toda parte. Nenhum prédio, muro, casa - nada é poupado. Não sei o que essa garotada (imagino que sejam garotos, ou será que não?) pretendem com essa estranha ocupação, o que lhes dá de proveito, qual o barato da coisa. Deve ser como cheirar cocaína, adrenalina a mil (ou naftalina, como disse o Jardel), emoções à flor da pele, sensação de risco, essas coisas bem humanas e idiotas.
Não é que agora eles - os hunos - chegaram com tudo ao Jardim Botânico e estão mandando ver. Na Terceira Perimetral, na Salvador França, ali perto do Fome Zero (um abraço ao nosso amigo André, uma das maiores fortunas do bairro!) está tudo pichado, inclusive os tapumes das obras. Ou seja - o comerciante, o empresário, o morador ou seja lá quem for, dá um duro danado, capricha na fachada da sua casa, empresa ou prédio, deixa tudo bonitinho, pintadinho, caprichado, e de repente, na calada da noite (desculpem o clichê mas não encontrei outra expressão no momento) uma milícia de hunos vai lá e mete spray em tudo, emporcalhando o que antes talvez fosse belo.
Vou perguntar de novo: qual o barato dessa gente? Qual será a grande emoção que dá sair por aí, à noite, nesse frio de congelar pinguim, munido de spray, talvez de escada, sei lá, para desenhar ou escrever aqueles sinais góticos que só eles entendem?
Tem coisas que ninguém explica. Dizem que o besouro, tecnicamente, não poderia voar, pois é muito pesado e tem asas curtas. Só que ele, como todos sabem, voa - meio desajeitado, aos trancos e barrancos, mas voa, contrariando a tese dos cientistas.
Pois os pichadores são parte desse fenômeno, contrariam a lógica. Ninguém consegue entender o porquê (talvez algum psicólogo saiba) da coisa, a razão, a motivação dessa gente, que bem poderia estar em casa, fazendo palavras cruzadas, torturando o gato ou passando a mão na bunda de empregada. Porém eles saem à noite, na surdina, para realizar uma obra de enfeiamento da cidade - talvez para eles seja de afirmação perante os colegas de ofício, a sua tribo, ou horda.
Cá prá nós: essa gente, quando a Brigada chega e lhes dá uma flagra, deve apanhar (merecidamente, na minha opinião) pra chuchu. Bom, talvez seja esse o grande barato da coisa; ser apanhado e apanhar do brigadiano. Êta gentinha masoquista, sô! (Conselheiro X.)

Ela também lê




Gabrielle Chanas também lê o Conselheiro X.

terça-feira, junho 17, 2008

Belo Botânico: o riacho e a Natureza serena







Imagens do Jardim Botânico nesta terça-feira fria, mas de sol. O riacho Ipiranga - ou arroio Dilúvio - com suas águas turvas e imundas que contrastam com a serenidade plantada da Natureza em volta. Ao meio, a ponte, na rua Veríssimo Rosa. À esquerda, no alto, a imagem de um novo e grande edifício que surge, na rua Chile, algo cada vez mais comum. Parado, o caminhão de mudanças aguarda o frete. Bairro em franco desenvolvimento, o Botânico conta, hoje, com cerca de 15 mil habitantes. Tem um shopping center, duas agências bancárias, uma agência de Correios, oito cinemas, três supermercados (um que permanece aberto até às 24 horas), um CTG, pizzarias, churrascarias, pubs, quatro lans house, faculdades, áreas de lazer, bibliotecas, um Jardim Botânico (naturalmente...), botecos de primeira à ultima categoria, um grande hospital, uma escola pública até o segundo grau, pontos de táxi, diversas linhas de ônibus que levam qualquer um até a rodoviária e cruzam a cidade de sul a norte, duas linhas de lotação, quadras de esporte, academias de ginástica, academia de kung-fu, uma conceituada escola de dança, um centro comunitário, nenhuma associação de moradores, gente simpática e antipática, muita natureza, cachorros e passarinhos, um posto da Brigada Militar, vários de combustível, um motel de primeira, e até uma clínica para fazer exame de DNA... Ah, e está a dez minutos de carro do centrão de Porto Alegre e bem pertinho da PUC.
* Para ver as fotos ampliadas, clique em cima delas.

Um dos primeiros prédios do Botânico

Pouca gente sabe, mas ele tem história.


Nesta madrugada de terça-feira o Jardim Botânico teve até geada - nada de estranhar para um dos bairros mais frios de Porto Alegre. Durante a madrugada, a temperatura chegou a 1 grau e a noite foi de muitas cobertas e acolchoados.
Mas a manhã é de sol e de previsão de chuva para quinta-feira - aí sim, vai piorar. Por enquanto, vamos aguentando um inverno - que nem chegou, oficialmente - que promete ser semelhante ao do ano passado.
Sem reclamações, no entanto: esse é o Rio Grande que nós conhecemos desde meninos, e que nem mesmo o aquecimento global esquentou.
Resgatando a história do bairro: nesta foto, um dos primeiros prédios construídos no Jardim Botânico, provavelmente no início dos anos quarenta, habitado até hoje, na esquina da Salvador França com a Surupá. Sinal dos tempos: está todo pichado.
* Para ver a foto ampliada, clique em cima dela.

A vida sofrida de Neuza Goulart Brizola: exílio, depressão, companheirismo e alcoolismo








Ela foi a grande companheira de Leonel Brizola (falecido) - e, em toda a sua vida, habituou-se a conviver com o poder. Isso, porém, não a impediu de ter uma existência sofrida, cheia de altos e baixos, e de, por uns tempos, tornar-se alcoólatra.
Neuza Goulart Brizola, mulher do ex-governador gaúcho e fluminense - o amado e odiado homem que garantiu a Legalidade e a posse de Jango, seu irmão - faleceu em 7 de abril de 1993, uma quarta-feira, aos 71 anos de idade, na clínica Pró-Cardíaco, no Rio de Janeiro, onde morava. O laudo atestou infecção generalizada e sérios problemas respiratórios. Foi enterrada em São Borja, assim como Jango, assim como Getúlio Vargas (que foi seu pardinho de casamento), assim como Leonel, também falecido (sem ter nunca ter realizado o seu sonho de se presidente).
Elegante, discreta, bonita, Neuza conheceu Leonel em uma convenção do Partido Trabalhista Brasileiro, em São Borja, onde nasceu, ainda nos anos quarenta. Conta-se que trocou um outro pretendente rico por um jovem engenheiro em início de carreira política. Quando casaram-se, ela tinha 28 anos - e nunca se arrependeu da opção: a união dela com o temperamental Brizola parece ter sido amorosa, senão apaixonada. O marido chamava-a de "queridinha", era seu confidente e amigo. Foram apaixonados por toda a vida e tiveram três filhos - João Vicente, João Otávio e a problemática Neusinha - hoje bem mais calma.
Não era para menos: ao lado do líder trabalhista, Neuza suportou muitos anos de exílio (15 longos anos) e perseguições políticas em terras estranhas, sem jamais esmorecer. Antes, quando Brizola era governador do Rio Grande do Sul, chegou a doar uma de suas sete fazendas - que herdou dos pais - para a reforma agrária que seu marido promoveu no Estado, e vendeu outras quatro para garantir o sustento da família, no período da Ditadura, quando viveram no Uruguai e depois em Portugal e nos Estados Unidos. Vendeu mais uma, quando voltaram ao Brasil, em 1979, para comprar o apartamento na avenida Atlântica, em Copacabana - o QG de Brizola, e onde morou até a sua morte.
DEPRESSÃO - Os primeiros seis anos de exílio foram duros. No frio Uruguai, viveram em um apartamento sem calefação ou ar condicionado. Depois a família mudou-se para uma fazenda, a 250 km de Montevidéo - lá não havia energia elétrica ou telefone. Mulher prendada, pela primeira vez obrigou-se a cozinhar. Disse mais tarde, sobre isso: "Só quem passou pelo exílio sabe como é triste ser brasileiro fora de sua pátria".
Em 1983, no Brasil, tratou-se durante 75 dias, nos Estados Unidos, de uma crise de depressão, algo cada vez mais comum - sequer chegou a asistir à posse do marido no Palácio Laranjeiras. Mais tarde internou-se em uma clínica para recuperação de alcoólatras, na Espanha.
Em 7 de janeiro de 1993, em Nova York, foi internada às pressas em um hospital, com uma úlcera perfurada. Permaneceu dois meses na UTI, sedada. Carinhoso, Brizola a visitava duas vezes por dia e passava longas horas à beira da cama, afagando seus cabelos. Alguns dias antes da sua morte, sem poder falar, trocava bilhetes com o marido.
Talvez por tudo isso, Neuza abusava dos calmantes e antidepressivos, bebia muito e fumava. Em 1986, ela e Leonel combinaram de parar de fumar - o que ele conseguiu, ela não. A esse tempo já havia se submetido a uma operação para a retirada de um tumor em um dos seios. Sofreu também com as brigas entre seu marido e o irmão Jango - reconciliados enfim em 1976, pouco antes do presidente deposto morrer.
Seu maior sonho, no entanto, nunca aconteceu: voltar e envelhecer junto ao marido, na sua São Borja, de preferência bem longe da política.

segunda-feira, junho 16, 2008

O velho Miramar: ao menos, restou o prédio


Nos velhos tempos - anos 50, 60 e 70 - quando não se sonhava com shoppings centers (e muito menos com as 8 salas do Cinemark do Bourbon), o Cine Miramar era uma das opções de lazer dos moradores do Jardim Botânico. Muita gente que está hoje na casa dos cinquenta ou sessenta anos, lembra bem dele - das películas em "tecnicolor", dos seriados que passavam antes do filme, do Canal 100... Cinema popular, um dia - como aconteceu com outros milhares no Brasil todo - fechou as portas e ficou na saudade. Felizmente, o velho prédio (na avenida Coronel Aparício Borges, 2730, no Partenon, quase defronte à igreja de São Jorge)) ainda não foi demolido - lá funciona hoje uma agência do banco HSBC e uma filial das Lojas Colombo.
* Para conhecer mais a história do bairro, clique à esquerda, nas postagens de Abril e Maio.

O galã que escondia a doença que o matou


Quem viveu os anos setenta e oitenta lembra bem dele - um galã com cara de garoto, o queridinho das adolescentes: Lauro Corona.

Em julho de 1989, quando o Brasil ainda não havia realizado a sua primeira eleição direta para Presidente da República depois do final da ditadura, e Sarney ainda estava no Palácio do Planalto, Lauro Corona morreu, aos 32 anos de idade, em uma clínica no Rio de Janeiro, vítima de infecção respiratória, septicemia, infecção oportunista, miocardite, insuficiência renal aguda e hemorragia digestiva alta. Ou seja, sabe-se hoje, morreu de Aids, muito embora tanto ele quanto a sua família insistissem em negar a existência da doença - algo que nem chegava a ser estranho para quem não assumia a sua homossexualidade.

A morte de Corona foi muito comentada, em uma época em que a Aids ainda era algo quase maldito e, pior, matava muito rapidamente - o ator faleceu apenas seis meses depois de apresentar os primeiros sintomas do mal. Foi enterrado em uma urna, na presença apenas de parentes e amigos mais próximos - a imprensa, odiada por sua família por tudo que havia comentado a respeito, foi barrada por guarda-costas. Ninguém, nem os demais atores globais, comentou ou emitiu qualquer opinião a respeito.

3 MIL VÍTIMAS EM 89 - A Aids chegou ao Brasil em 1980 e, em 1989, pouco mais de 3.500 pessoas haviam morrido infectadas. A epidemia, algo novo, assustador, era veloz, devastadora e galopante - naquele ano de 89, 32% dos brasileiros que se descobriram contaminados no mesmo ano já haviam falecido. Hoje, cuidando-se bem, pode-se viver uma vida inteira com o vírus.

Ator global, que pouco fez teatro, cara de garoto, praticante de esportes (natação, surfe, ginástica, remo), na época da geração dourada e praiana do Rio de Janeiro, com apenas 1,63 m de altura, Lauro Corona consagrou-se como o Beto, da novela Dancin' Days, do ano de 1978, um grande sucesso na época em que as discotecas explodiam como modismo em todo o mundo. Ao seu lado estava a grande amiga Glória Pires - amiga, confidente e vizinha.

Corona ganhou muitos elogios por sua interpretação. Mais tarde, depois de várias novelas, fez o papel de um gigolô, em Memórias de um Gigolô, ao lado de Bruna Lombardi, Ney Latorraca e Elke Maravilha. Também fez o português Manoel Victor, em Vida Nova - por isso chegou a ser apelidado de "o galã da novela das seis". No cinema, fez Bete Balanço e O Sonho Não Acabou, além de ter gravado dois discos. Grande amigo de Cazuza (ou algo mais) - morreu antes do colega, que àquela época já estava com a doença, e reconhecia isso abertamente.

Na vida pessoal, era discreto - gostava de receber amigos, ler revistas em quadrinhos e ver videocassete (eram os tempos, lembram?)- e, mesmo visto na companhia de mulheres, não se conhecia nenhum romance seu com colegas. A exemplo do que acontece hoje com galãs do seu tipo, apresentava inúmeros bailes de debutantes e recebia cartas apaixonadas das fãs. Em 1981, no entanto, foi processado por uso de cocaína - seu nome apareceu na lista de um traficante preso pela Polícia. Foi inocentado.

Pouco antes da sua morte, o ator estava muito magro e, na entrega do prêmio Sharp de música, no mês de abril, trazia uma expressão perturbada no rosto e um olhar vago. A esse tempo, mantinha-se isolado e recusava-se a tratar a doença - alegava que sofria de estafa pelo excesso de trabalho e até de alergia às tintas utilizadas nos cenários da novelas. Nos anos 80, o AZT era, praticamente, a única droga um pouco eficaz para deter ou amenizar os sintomas do mal. Corona nunca a utilizou - ou talvez só nos momentos finais. Segundo alguns amigos, como Ney Latorraca, ele parecia querer se convencer que não tinha mesmo AIDS. Já havia se afastado então de sua última novela, com o sugestivo título de Vida Nova.

Os anos oitenta - especialmente no final - foram trágicos no que se refere à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Rocky Hudson,Betinho, Cazuza, o escritor Herbert Daniel, o artista plástico Jorge Guinle Filho (filho do playboy, milionário e mulherengo Jorge Guinle) , entre outros, desenvolveram a doença, que "secava" e matava rapidamente. O pior, porém, era o estigma e o preconceito da sociedade - muitos se recusavam até mesmo a dar a mão a um aidético, temendo o contágio.
* Para ler mais histórias como esta, clique em postagens "2006", à esquerda.

domingo, junho 15, 2008





O poeta que morreu de desgosto

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Carlos Drummond e Andrade
Já se vão 20 anos - quase 21 - que Carlos Drummond de Andrade morreu. Para muitos, o maior poeta brasileiro de todos os tempos, Drummond - pouca gente lembra - faleceu 12 dias depois da morte da sua filha, Maria Julieta. E, conta-se, morreu de desgosto, de falta de vontade de viver, aos 84 anos de idade, às 8h45 minutos do dia 17 de agosto de 1987, uma segunda-feira, no Rio de Janeiro, onde morava havia muito tempo. Sepultado sem orações ou discursos - como pediu, já que era ateu (ou agnóstico, como queiram), Drummond estava internado no hospital, vítima de dores no peito. Cardíaco, já havia sofrido infartos anteriores. Foi sepultado no cemitério São João Batista, na presença de quase mil pessoas - entre eles o presidente em exercício, Ulysses Guimarães - Sarney estava no exterior.

Sua única filha - de quem era não só pai, como o maior amigo ("eles se entendiam só pelo olhar", disse um amigo) - não havia resistido a um câncer generalizado. No enterrro, o poeta confidenciou a um amigo: "Não tenho mais futuro, acabou tudo para mim". Doze dias depois, ele se deixou levar. Coisas que acontecem.

LIXO COMO PRESENTE - Homem fechado, reservado, arredio, tímido, meticuloso como todo bom mineiro, Drummond - nascido em Itabira, em 31 de outubro de 1902, em uma família de fazendeiros - publicou 30 livros de poesia (mais os de crônicas), dos quais foram vendidos mais de 500 mil exemplares. Mas não gostava de teorizar sobre poesia (coisa muito comum entre outros poetas) e preferia que o chamassem de jornalista. Expulso do colégio, em Belo Horizonte, aos 19 anos - por "insubordinação mental" - formou-se em Farmácia ("porque era o curso mais curto"), profissão a qual jamais exerceu. Foi, sim, professor de Geografia e Português, jornalista e funcionário público - por sinal muito exigente. Aos 23 anos casou-se com Maria Dolores - e com ela viveu até o final da vida.

COMUNISTA - Carlos Drummond trabalhou no Ministério da Educação durante a ditadura Vargas, a convite do seu amigo Gustavo Capanema, mas - lá pelos anos quarenta, em especial durante a Segunda Grande Guerra - alinhou-se ao Partido Comunista Brasileiro, o velho PCB, na luta contra o fascismo. Chegou, a convite de Luis Carlos Prestes, a dirigir o jornal do partido - o Tribuna Popular - mas, por incompatibilidade, demitiu-se três meses depois de assumir, por não suportar a ortodoxia comunista e stalinista. Mais tarde, explicou: "O que eu escrevia não saía, e o que saía eu não entendia nada".

Nos anos quarenta, durante a Guerra, compôs poemas bem esquerdistas, até de louvor ao staninismo - num deles saúda a resistência de Stalingrado (hoje com outro nome) aos invasores nazistas. Em 1964, já bem decepcionado com a política, com a esquerda e a politicagem, apoiou o Golpe Militar - dois meses depois já estava novamente decepcionado e enojado com aquilo tudo.

Muito abalado com a morte da filha (teve um filho antes, que morreu poucos meses depois do nascimento), ainda mantinha seus hábitos impecáveis e ordeiros, como o de acordar às 7 horas da manhã e dormir tarde, e o de arrumar as cestas de lixo com tal minúcia que "pareciam presentes de Natal", ou "embrulho de presente". Telefonava seguidamente aos amigos, para saber como estavam e dava lá seus palpites e conselhos.

Cético, bom mineiro, Drummon teve outro grande mérito: já reconhecido com o maior poeta brasileiro - aquele que fazia poesia simples, sem firulas, quase na linguagem do povo - recusou-se a se candidatar à Academia Brasileira de Letras (Moacir Scliar também disse isso nos anos 70, depois quis ser "imortal" e hoje participa dos glamourosos chás da "Casa de Machado de Assis").
E como hoje é domingo, é um bom dia para ler Drummond, na cama, entre as cobertas.

"E agora, José?


a festa acabou,


a luz apagou,


o povo sumiu,


a noite esfriou,


e agora, José?


e agora, você?


você que é sem nome,


que zomba dos outros,


você que faz versos,


que ama, protesta?


e agora, José?"

Salvador França às 6 da tarde

Domingo ventoso e frio, de um céu azul gremista, sem nenhuma nuvem, frente fria que chegou para - dizem os meteorologistas - ficar por mais uma semana. E ainda não estamos no inverno. Bom para comer bergamotas, almoçar na churrascaria do 35 CTG ou na Bambino, visitar o Jardim Botânico e, mais tarde, assistir música ao vivo (das 17 às 20 horas) no Bourbon Shopping. E tem também a Domingueira do CTG 35.
Ontem, no final da tarde e início da noite, a temperatura mostrava-se mais amena. Na avenida Salvador França ( hoje parte da Terceira Perimetral), esquina com a avenida Ipiranga, o movimento de veículos mostrava a cara de uma Porto Alegre que, nos últimos anos, viu aumentar enormemente a sua frota. Veja no vídeo (clique na seta para rodar) um minuto de movimento nesta avenida de ligação entre a Zona Sul e a Zona Norte e que, não faz muito tempo, era uma simples faixa de asfalto cercada de casinhas de madeira.