quinta-feira, julho 26, 2018

Adnael, em A Charge Online.


Mister Barrick, o Velho Jack, deixou saudades nos gramados gaúchos



Luís Fernando Veríssimo lembra dele apitando grenais, e o citou em uma de suas crônicas. Carlos Heitor Cony, jornalista e escritor, já falecido, recordava o gol do Brasil contra o Uruguai que ele anulou pela antiga Copa Rio Branco. O certo é que sua figura faz parte da história do futebol gaúcho, brasileiro e sul-americano nos anos que se seguiram ao término da Segundo Guerra Mundial.
Seu nome: Cyril John Barrick, o “velho Jack”, que o Correio do Povo definiu como “o consagrado e fleumático árbitro britânico que tanto bem anda fazendo ao futebol gaúcho”, o “número 1 do mundo”.
Ninguém sabe exatamente – ou talvez alguém ainda saiba – como o “velho Jack” chegou ao Rio Grande do Sul naquela segunda metade dos anos quarenta, já consagrado como um juiz de primeira grandeza no futebol inglês. O que se presume é que numa Inglaterra devastada e empobrecida pela Segunda Grande Guerra ele tenha resolvido procurar trabalho em querências mais pacíficas e ensolaradas e onde o esporte bretão também era amado, o que já acontecia com colegas seus. O velho Jack, a julgar pelas fotos, já deveria contar os seus quarenta e tantos anos quando deixou a Velha Albion castigada pelos bombardeios nazistas e veio para a América do Sul ganhar uns trocados para sustentar a família que ficara na Europa.
O certo é que aqui o “velho Jack” ganhou respeito e deixou saudades por onde passou e apitou, em especial no Rio Grande do Sul, estado que foi, tudo indica, sua porta de ingresso no mundo futebolístico sul-americano. Versátil e disposto a tudo por um punhado de libras que remetia todo mês para a família, Mister Barrick apitou tanto jogos da seleção brasileira como partidas amistosas em surrados e toscos campos de futebol. Ter Mister Barrick apitando era uma espécie de certificado de qualidade. Exótico e famoso, o Velho Jack virava uma atração à parte.
Ao que parece, Mister Barrick foi inicialmente contratado pela Federação Rio-grandense de Futebol para apitar os jogos do campeonato citadino. Mas, malandramente, bem no jeitinho brasileiro, esta passou a emprestá-lo a outros centros do País. Assim o velho Jack apitou nos Eucaliptos, na Baixada, em São Januário, no Pacaembu, no Maracanã, no estádio da Timbaúva, na Chácara das Camélitas, na Colina Melancólica... Apitou jogos do Brasil contra outras seleções e apitou clássicos platinos, onde também tinha fama. A Federação gaúcha o emprestava, cobrava por isso, e nem sempre repassava o dinheiro ao fleumático e tolerante inglês.
Quantos anos ficou Mister Barrick no Brasil? Será que voltou para a sua Inglaterra ou resolveu se aclimatar nos trópicos? O mais provável é que tenha voltado: cansado da desorganização do futebol brasileiro e das promessas não cumpridas, às vezes o Velho Jack botava a boca no trombone, como em abril de 1950, alguns meses antes da Copa no Brasil. Conforme o Correio do Povo noticiou, Barrick estava insatisfeito e, pior, sentia-se explorado pelos dirigentes esportivos gaúchos:
“Por ocasião de sua recente ida a Caxias do Sul, a convite do presidente do Nacional, que é também presidente do Departamento de Futebol da Capital, o laureado apitador britânico queixou-se amargamente da maratona a que estava sendo submetido, atuando várias vezes em uma semana, por ocasião da temporada do Peñarol em nossos gramados. A um dos nossos cronistas, Mister Barrick alegou sentir dores na coxa direita, à altura dos rins, dizendo a impossibilidade em que se achava de continuar a apitar partidas fora dos termos do compromisso, ou seja, mais de três durante uma semana. Mister Barrick chegou a falar em rescisão do contrato, caso fosse obrigado a trabalhar além das suas forças. Agora o Departamento de Futebol da Capital acaba de tomar outra deliberação que está merecendo crítica nos círculos esportivos. É que os clubes uruguaios, Nacional e Peñarol, solicitaram por empréstimo a presença do Velho Jack em campos orientais para um torneio quadrangular que pretendem realizar juntamente com clubes brasileiros. Os maiorais do nosso futebol de pronto aquiesceram, condicionando-o a uma questão de data e, mais, exigiram 25 mil cruzeiros por arbitragem, devendo o apitador, por sua vez, perceber 5 mil cruzeiros em cada uma.”
“Isso quer dizer, pura e simplesmente, que o Departamento de Futebol da Capital resolveu que os clubes uruguaios venham a pagar os honorários de Mister Barrick pelos próximos quatro meses, com a visível economia de 100 mil cruzeiros para os clubes”
E assim conclui o Correio do Povo: “Ora, Mister Barrick não é nenhuma criança, e qualquer dia, quando achar que está sendo mal empregado, não terá dúvida alguma em pedir a rescisão do seu contrato a fim de continuar o seu verdadeiro apostolado esportivo em qualquer outro centro mais adiantado do que o nosso e onde não sirva unicamente de atração para rendas, ou – o que é pior – para evitar que os clubes tenham que entrar com dinheiro para suprir as modestas arrecadações auferidas com as não menos modestas exibições de seus esquadrões de profissionais..." 
É, o Velho Jack, o apitador número 1 do Mundo, deixou saudades em terras gaúchas, mas será que nós deixamos saudades nele?

quarta-feira, julho 25, 2018

O jovem Renato despejando refrigerantes nas cabeças das moças... Anos oitenta.







O Renato Portalupi de hoje é um ajuizado e ponderado senhor de mais de 50 anos, pai de uma filha e ídolo da nação gremista. Nos vestiários e nos campos é um técnico de futebol de grande competência que sabe lidar com crises e conflitos.
É, o tempo amadureceu aquele craque boa pinta que veio de Bento Gonçalves ainda jovenzinho e logo se tornou campeão da América e do Mundo pelo Grêmio Portoalegrense. Exibicionista, imaturo e vaidoso, com pinta de pleiboi, o jogador dos anos oitenta e noventa parece ter pouco a ver com o treinador de 2018.
No início de janeiro de 1983 o jovem Renato, que ainda não havia completado 21 anos, virava notícia de jornal por suas brincadeirinhas de mau gosto tendo por cenário a praia de Tramandaí, no litoral gaúcho, onde alguns atletas do tricolor passavam dias das férias. Brincadeirinhas de mau gosto que acabaram causando tumulto na madrugada quente e movimentada da Rainha das Praias. Com o título “Renato Provoca Confusão na Praia”, o Correio do Povo descrevia: “Os jogadores do Grêmio Renato, Paulo Roberto e Paulo César chamaram a atenção dos veranistas, em Tramandaí, às primeiras horas da madrugada de ontem, quando se encontravam sentados em uma mesa no bar e Restaurante Casa Branca, na calçada da avenida Emancipação. A presença deles acabou se transformando numa confusão, com ameaça de briga, envolvendo o ponteiro-direito Renato, exigindo a intervenção da Brigada Militar, sem que o fato tivesse se transformado em ocorrência policial.
“Todos alegres e brincalhões, os veranistas se divertiam com as extravagâncias de Renato. Ele apanhou uma garrafa de guaraná que duas garotas tomavam numa mesa e despejou no chão. Foi a uma outra mesa e bebeu o suco de laranja de outras duas veranistas, cuspindo o suco na cabeça de uma delas. Os veranistas riam e logo passaram à condição de torcedores provocando os jogadores e gritando “Geraldão!” Renato até se irritou com a provocação dos torcedores e deu uma de querer tirar satisfações. Os jogadores brincavam ainda com a toalha da mesa e bar e num determinado momento um copo de vidro quebrou-se quando Renato o levava à boca. Não demorou muito e logo surgiu uma correria do público quando os jogadores se afastavam, mas eles discutiam em altos brados entrei si e o lateral Paulo Roberto tentava acalmar Renato.  Os soldados da Brigada Militar chegaram e trataram de isolar os jogadores do público, conduzindo-os para a parte dos fundos do Hotel Strassburguer e fechando um portão de madeira. A confusão não ficou bem esclarecida. Mas, ao final, um policial da Brigada Militar dizia que se os jogadores quisessem brigar entre si, isso era com eles, e poderia acontecer nos fundos do hotel, mas longe do público”.    
A propósito: Geraldão era o atacante do Inter de então e um grande fazedor de gols.

Adnael, em A Charge Online.

Com o Grêmio onde o Grêmio estiver, a frase que os tricolores levavam aos estádios







Com o Grêmio, onde o Grêmio estiver. Muita gente pode imaginar que tal verso, contido no hino do imortal tricolor, é de autoria de Lupicínio Rodrigues: “Até a pé nós iremos, com o Grêmio onde o Grêmio estiver” Na verdade os torcedores mais antigos – bem mais antigos – devem recordar da faixa que a torcida levava, religiosamente, a todos os jogos do Grêmio, fosse onde fosse, e que Lupi – no ano de 53, o cinquentenário do clube da Baixada, modificou um pouco da frase original “Com o Grêmio onde estiver o Grêmio”.
Com o Grêmio onde estiver o Grêmio, aliás, é o título de uma grande reportagem que Cid Pinheiro Cabral fez para a Revista do Globo em dezembro de 1951: “Com o Grêmio onde estiver o Grêmio: é o lema da torcida do clube gaúcho mais vezes campeão”. Acima do título, uma grande foto de Santos Vidarte mostrava os jogadores em campo sendo abraçados pela torcida. Ao lado, lia-se a legenda feita por Cid: “Esta comemoração é pela conquista de um campeonato? Não, trata-se apenas de um gol do Grêmio. Não raro a torcida tricolor, que é a torcida gaúcha de maior espírito de colaboração, rompe os cordões de isolamento, escapa ao controle da polícia e vai comemorar o feito em pleno gramado com os autores diretos da façanha.”
Cid Pinheiro Cabral, que, como todos sabem, era colorado, enchia o tricolor de elogios e o chamava de “autêntico papão de campeonatos”. Na verdade, a Revista do Globo estava publicando uma série chamada Os Grandes do Futebol, na qual contava a história dos clubes do Rio e de São Paulo e também, é claro, da dupla Grenal.
Em uma época em que tanto Grêmio como Internacional eram olhados com certo desdém pelo centro do País e não faziam parte do chamado “futebol arte” e sim da viril escola platina, o Grêmio, sobretudo, representava essa fibra gaúcha. Foi assim na famosa excursão que o tricolor realizou por vários países da América Central no final de 1949. Os gaúchos jogaram contra selecionados nacionais, como da Guatemala, Honduras e El Salvador, e não perderam nenhum dos nove jogos que disputados. Ou melhor, venceram oito e empataram um. Até os presidentes de tais países compareciam aos estádios, onde o Grêmio era tratado como um inimigo a ser caçado.
O cronista Cid lembrava desse feito, ainda tão recente: “O maior feito em serie de um clube gaúcho no exterior cumpriu-o o Grêmio, em 1949, quando passou invicto, na América Central, por nada menos de nove cotejos. Sua enorme e entusiástica legião de admiradores recebeu-o com uma das maiores e mais carinhosas manifestações de que já foi teatro a Rua da Praia de Porto Alegre”.  O jornalista lembrava o fato do Grêmio ter ganho 25 campeonatos em 48 anos de vida.
Na época da reportagem o Estádio Olímpico já estava em fase de construção, e Cid lembrava que isso – ter um grande estádio - era uma necessidade: “Há vários decênios que o clube mais vezes campeão do Brasil se acomoda num recanto, histórico e tradicional na verdade, mas incompatível com as necessidades mínimas atuais, de agremiação modelar, praticante de quase todas as modalidades de esporte terrestre, o “Fortim da Baixada”.
Naquele ano de 51 estavam iniciando as obras de terraplanagem do Olímpico Monumental, e muitas campanhas vinham sendo feitas para tornar a nova casa do Grêmio uma realidade. Quanto à torcida tricolor, o mais lido jornalista esportivo daquela época confessava sua admiração: “Quem for assistir a um jogo do Grêmio Porto-alegrense verá, como tela de fundo do cenário onde se aglomera a sua grande torcida, enorme faixa de pano onde se lê: “Com o Grêmio onde estiver o Grêmio.” Esse slogan, consagrado já entre os torcedores do clube das três cores, caracteriza perfeitamente as relações entre a veterana e tradicional agremiação e seus simpatizantes”.
Como se vê, o grande Lupicínio Rodrigues, com seu senso estético e ouvido musical, apenas adaptou a velha frase para a hoje conhecida “com o Grêmio onde o Grêmio estiver”.

terça-feira, julho 24, 2018

Genildo em A Charge Online.

Os 50 anos do Inter, a máquina fornecedora de craques para a seleção brasileira







No dia 4 de abril de 1959 o Sport Clube Internacional festejou os seus 50 anos de fundação, data que já havia sido comemorada por seu grande rival, seis anos antes. E assim como o Grêmio, em seus festejos de cinquentenário, não vivia um bom momento futebolístico, o mesmo se deu como o “clube do povo”. O Grêmio, a partir de 1956, começou a enfileirar títulos metropolitanos e estaduais, dando fim a uma era de hegemonia dos “diabos rubros”, como alguns então chamavam o escrete do Estádio dos Eucaliptos.
Na Revista do Globo de abril de 59, o jornalista Valter Galvani – um dos nomes mais conhecidos da imprensa gaúcha, e não somente na área de esportes – recordou detalhes curiosos da fundação do Inter, lembrando que o colorado iniciou como uma “dissidência” do Grêmio e tinha até nome de Grêmio. Galvani – que é colorado – diz em seu texto sobre o cinquentenário do clube: “A nota curiosa vem da fundação. Tal como o Flamengo do Rio, que nasceu de uma dissidência do Fluminense, o Sport Clube Internacional brotou de um “Sport Clube XV de Novembro, que funcionava como uma espécie de filhote do Grêmio Portoalegrense. As cores eram branca e preta. O campo era provisório, na Redenção, local onde hoje funciona o Parque Esportivo da Escola de Cadetes. Um grupo desligou-se do tal XV de Novembro e criou o Grêmio Football Internacional. Tinha alguns meses de existência com o tal nome o clube que reunia nomes como Arquimedes Fortini, Julio Hanke, Irmãos Karl e outros quando, de São Paulo, chegaram os irmãos Poppe. Júlio Poppe, o mais velho dos dois, foi o autor da ideia. Propôs que fosse extinto o Grêmio Internacional e se reunissem os rapazes com os irmãos Poppe no Sport clube Internacional, nos mesmos moldes do idêntico Sport Clube Internacional que então existia em São Paulo, com as mesmas cores: encarnado e branco. E no dia 4 de abril de 1909 surgia oficialmente o clube. Como um pequeno regato. Ninguém suspeitaria o grande rio que ali estava em embrião.”
Prossegue Valter Galvani, agora se referindo aos primeiros grenais: “O Grenal, todos sabem, é a festa do povo por excelência em nosso meio. Sua tradição, já profundamente arraigada, divide família, amigos, irmãos, na separação das águas que obrigatoriamente se faz.” Em seguida o jornalista passa a citar Arquimedes Fortini, famoso jornalista, intelectual e historiador da primeira metade do século 20: “Tinha poucas semanas a fibra crioula mas logo quis pôr à prova o seu ardor, sob as ordens de José Poppe, enfrentando, em julho de 1909, o mais poderoso elenco da Capital, o Grêmio. Foi vencido, como é natural, mas os componentes do quadro não desanimaram com o batismo de fogo. E então trabalharam cada vez mais. Um dos irmãos Poppe dizia: - Reconheço existir uma grande diferença de nível entre o nosso clube e os demais daqui. Mas um dia ainda será um grande clube. E eram proféticas as suas palavras.”
Valter Galvani lembrava que o Inter havia sido fundado exclusivamente para o futebol mas em breve se dedicava também ao atletismo, conquistando muitas glórias: “Quatro anos depois de fundado já chegava ao título máximo do futebol da cidade. E decidido a não largar: ficou cinco anos no poder. Não foi a última vez que o Internacional exerceu a ditadura no esporte da capital gaúcha e do Rio Grande.”
E o jornalista prosseguia, falando sobre o famoso rolo compressor dos anos quarenta e que conquistou um feito inédito no futebol brasileiro: foi hexacampeão estadual, conquistando os títulos de 1940, 41, 42, 43, 44 e 45.
“Durante seis anos seguidos mantivera-se no poder. Cedeu a posição no ano seguinte ao seu rival tradicional, ficando no segundo posto, mas em 1947 e 48 já voltava ao poder. Nomes como Tesourinha, Adãozinho, Vilalba, Rui, Carlitos, Russinho, Ávila, Alfeu, Nena, jamais deixarão a memória de quantos os conheceram e viram em ação. Eram craques fabulosos do famoso e inesquecível Rolo Compressor. Mas o “Rolo” envelhecera. Era preciso renovar. Pensava-se em reconstituir o quadro.  Seria impossível. Só criando algo novo, gente nova. Foi assim que surgiu o novo quadro, com Florindo, Oreco, Paulinho, Salvador, Odorico, Luizinho, Bodinho, Airton, e tanta gente mais. A famosa “cortina de ferro”, por onde nada passava, era a linha de “halfes”: Paulinho, Salvador, Odorico. E mais quatro campeonatos sucessivos: 50, 51, 52 e 53.”
A reportagem da Revista do Globo chamava o Inter daquela época de “fornecedor da seleção”, em alusão aos craques que o colorado cedia para a seleção brasileira: “Desde os velhos tempos de Nelson Grant que o Sport Clube Internacional vem fornecendo jogadores para a seleção do Brasil. Da grande fábrica dos Eucaliptos tem saído gente capaz e que logo vai confirmar seu prestígio nas grandes batalhas internacionais. De 1940 para cá a coisa quase chegou ao exagero. Não havia seleção que não contasse com um jogador, ao menos, oriundo do reduto colorado. Começando por Tesourinha e passando por Paulinho, Salvador, Odorico, Larri, e chegando a Chinezinho, Oreco, etc.”
A reportagem concluía o seguinte sobre a grandeza do Inter nas comemorações do seu cinquentenário: “Talvez nem o próprio grupo de fundadores que, no longínquo 1909, resolveu criar um clube que reunisse a pequena “aristocracia crioula”, imaginasse que o seu pequeno sonho se projetaria tão longe. Que o seu clube viesse a se tornar com o tempo uma das maiores expressões do Rio Grande do Sul esportivo. Que viesse a se tornar o “clube do povo. Que no terreno do futebol profissional pudesse ir tão longe, tornando-se uma espécie de fornecedor oficial de craques para a seleção do Brasil”.

domingo, julho 22, 2018

Grêmio homenageia os uruguaios, campeões do mundo em 50, festejando-os no aeroporto


A identificação entre o Grêmio e o futebol uruguaio é pública, histórica e notória - e vem desde, digamos, o início dos tempos futebolísticos. Foi o Nacional de Montevidéu quem fez o jogo inaugural do Estádio Olímpico, em setembro de 1953 - alias, os "orientais" golearam os tricolores, em sua nova casa, por 4 a 1. Em 1950, quando o selecionado uruguaio veio ao Brasil, participar e ganhar a Copa do Mundo, com o célebre 2 a 1 no Maracanã, a delegação celeste fez escala no aeroporto de Gravataí - pertencente à Panair do Brasil, o único com pista cimentada no Estado - para ser homenageado por uma comitiva gremista, como já havia acontecido, um mês antes, na vinda dos bicampeões do mundo ao Brasil (espertamente, disseram então que "não tinham muitas pretensões" e que o favorito ao título era o escrete tupiniquim). Naquela ocasião eles foram recebidos, entre outros, por Saturnino Vanzeloti, presidente gremista. As reproduções acima são do Correio do Povo, aparecendo a taça Jules Rimet, exibida no aeroporto gaúcha e, vinte anos depois, conquistada em definitivo pelo Brasil. Mais tarde o maior orgulho do esporte brasileiro seria roubado e derretido. 
Tacho, no jornal NH (RS). A Charge Online.

José Luiz Datena quase saiu no braço com Diego Maradona


Em março de 2003 - portanto, 15 anos atrás - a revista Veja publicou uma matéria com José Luiz Datena, o comentarista e radialista que hoje é um dos rostos mais conhecidos da televisão brasileira. Na reportagem, Datena revela que tem como vícios tomar refrigerante toda hora (talvez, nos dias de hoje, tenha abandonado o hábito) e colecionar relógios. Outras curiosidades, é que o apresentador, então com 45 anos de idade (hoje tem 61), envolveu-se em uma quase briga física com Diego Maradona e foi preso pela polícia italiana, durante a Copa de 90, ao aparecer defronte ao Coliseu romano vestido de imperador. Reprodução da coleção do Conselheiro X.

Cardeal, sem um pulmão, quase não errava gols



Cardeal, não jogou na dupla Grenal.

Cardeal foi um dos maiores jogadores do futebol gaúcho – isso na época romântica, em que o profissionalismo mal iniciava no esporte brasileiro. Nascido em Santa Vitória do Palmar a 7 de novembro de 1912, Sezefredo Ernesto da Costa era atacante e ganhou o apelido de Cardeal pelo fato de jogar com um gorro vermelho. Cardeal – assim como o grande Lara, do Grêmio – morreu de tuberculose, em Montevidéu, em 4 de agosto de 1949, com apenas 36 anos de idade, depois de ter passado por muitos clubes, pequenos e grandes – o Nono Regimento, clube de origem militar de Pelotas, rebatizado de Farroupilha  em 1941, o Brasil de Pelotas, o São Paulo de Rio Grande, o Fluminense do Rio e Nacional de Montevidéu, entre outros.
Naqueles tempos não havia campeonato brasileiro de clubes, até pelas dificuldades de deslocamento em um Brasil primitivo e sem rápidos meios de transporte. Mas Cardeal, vice campeão brasileiro de 1936 pelo selecionado gaúcho (em uma decisão contra os paulistas em que, dizem os gaúchos, o árbitro deu uma mão ao pessoal da terra da garoa), foi convocado pelo técnico Ademar Pimenta para disputar o sul-americano de 1936, o que chamou a atenção dos uruguaios do Nacional, que o contrataram no ano seguinte. Em 1939 foi para o Fluminense, retornando para o Regimento de Pelotas menos de dois anos depois, clube pelo   qual ganhou o histórico título estadual de 1935, o ano festivo das comemorações do centenário farroupilha. A decisão foi contra o Grêmio, em Porto Alegre, e Cardeal fez dois gols na vitória de 2 a 1 contra a equipe tricolor.
Segundo a lenda, Cardeal só tinha um pulmão, já que o outro havia sido extraído quando se descobriu tuberculoso. Mesmo assim ele jogava e se impunha na grande área – era o que se chama hoje de “matador”. Parou de jogar em 1943 e faleceu em Montevidéu, com toda assistência médica que lhe ofereceu o Nacional, onde também brilhou.
A fonte básica desta pesquisa inicial é o buscador do Google. A parte abaixo é pesquisa nossa.
Em janeiro de 1976, em uma das suas crônicas dominicais na coluna Esporte Especial do Correio do Povo, Cid Pinheiro Cabral contou uma pitoresca historieta envolvendo esse craque do passado, que reproduzimos aqui na íntegra e que se chamava “Dali, Cardeal não errava...” .
Conhecido é o episódio do Carruíra, em Rio Grande, na década de 30. Atirando um pênalti contra o Botafogo, raspando a trave, mas pelo lado de fora, teve-o transformado em gol, sob a desculpa de que “Carruíra nunca errou nem errava um bola daquelas...”
Agora recebo do advogado Afif Jorge Simões Filho, de São Sepé, o relato de outro episódio envolvendo Cardeal – que aí vai como nos chegou.
“ – Há poucos dias esteve aqui em São Sepé, fazendo-nos uma visita, o distinto advogado de Bagé, Dr. Edgar Pinto, torcedor doente e alto prócer do Guarani. Contou-nos fatos interessantes do futebol bajeense, desde 1939, quando, guri, começou a frequentar os estádios da sua terra.
Esta aconteceu em Bagé, segundo relata o dr. Edgar, no início da década de 40 (1941 ou 42, por aí), quando o Farroupilha de Pelotas foi ali disputar um amistoso com o Guarani, levando como grande atração o inesquecível Cardeal já em fim de carreira, com um pulmão só e capacidade para jogar apenas um tempo, a pau e corda. Apitava a partida o ex-craque do próprio Guarani, conhecido por Gancho.
Ao terminar o primeiro tempo, ganhava o Guarani de 1 a 0. Faltando uns 30 minutos para o final, o Farroupilha apelou para o seu grande trunfo: colocou o Cardeal em campo para equilibrar (ou desiquilibrar) a partida. O Cardeal (e o sr. o viu jogar muitas vezes, certamente) dava a impressão de ser etéreo, imaterial, tal a facilidade e leveza com que passava pela zaga. Em fim de carreira, não tinha sequer força para grandes chutes, mas fazia o seu carnaval com a bola nos pés. Lá pelas tantas, pega a bola e derruba a dribles toda a defesa do Guarani, enquanto o árbitro Gancho, de apito na boca, segue atentamente o lance. Quando o Cardeal ficou na cara do goleiro, ouviu um tremendo apito e parou a jogada, pisando em cima da bola. Voltou para interpelar o Gancho, inconformado:
- Pomba, gancho, no hora em que eu ia fazer o gol, tu apitas.
- Olha, Cardeal, foi uma coisa estranha que aconteceu. Eu fiquei tão emocionado com a tua jogada que apitei sem querer. Foi um apito bobo que saiu da boca sem qualquer motivo. Mas podes ficar tranquilo: o gol não saiu... mas valeu!
E apontou o centro de campo, para nova saída. Os jogadores e a diretoria do Guarani cercaram o juiz, protestando aos gritos:
- É um absurdo! Onde é que estamos!
O Gancho argumentava:
- O gol estava quase feito, era só chutar.
Mas o pessoal do Guarani não se conformou:
- É um absurdo! O Cardeal podia chutar fora ou por cima, o goleiro podia defender...
E o Gancho, imperturbável:
- Vocês não conhecem o Cardeal... Joguei anos ao lado dele e contra ele, e gol como aquele ele nunca perdeu. Não haveria de ser hoje que iria perder...
E o jogo terminou empatado, apesar de todos os protestos do Guarani.