Futebol eficiente, aplicação, valentia e preparação: o Grêmio
é campeão mundial de 1983
Correio do Povo: chamada de página inteira para a transmissão de Tóquio |
Um jogo de muita aplicação e pouca inspiração. Assim a
revista Veja de 21 de dezembro de 1983 noticiou a conquista, pelo Grêmio
Porto-alegrense, do título mundial de clubes disputado em Tóquio, no Japão. A
final, de uma só partida, sem interferência da Fifa, se chamava Copa Toyota –
em alusão ao patrocinador – e também Copa Intercontinental, por envolver os
dois grandes continentes futebolísticos, Europa e América. Em 2017, a entidade
reconheceu o Grêmio como legítimo campeão mundial de clubes daquele ano.
Sob o título “Carnaval
em dezembro – o Grêmio Ganha o
campeonato Mundial de Clubes e brilha na entre-safra do futebol”, a revista
semanal de maior circulação do País destacou o contexto desanimador do futebol
brasileiro de então, que vinha da decepcionante derrota da seleção na Copa de
82, disputada na Espanha. “Qual o País que,
vivendo uma crise de entressafra como a que estamos atravessando, consegue
fazer dois campeões mundiais em apenas três anos?”, perguntava, em tom de
desafio, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Giulite Coutinho.
Ele se referia não só à conquista do tricolor gaúcho como também, dois anos
antes, a do Flamengo, do Rio, que havia se sagrado campeão mundial na capital
do Japão ao vencer do Liverpool da Inglaterra por 3 a 0. Desta vez, ao superar
o Hamburgo da Alemanha por 2 a 1, o Grêmio de Porto Alegre – ainda segundo Veja
– “teve competência suficiente, além de
muita valentia, para vencer um adversário que ganhou o campeonato europeu e
acaba de ser eleito pela revista inglesa Word Soccer a melhor equipe do ano em
todo o mundo”. O Hamburgo havia sido campeão da Liga dos campeões da UEFA
ao vencer a Juventus de Turim por 1 a 0. O Grêmio, por sua vez, conquistara
pela primeira vez a Libertadores ao bater o Penharol de Montevidéu, no Olímpico
Monumental, por 2 a 1 no segundo jogo.
Veja apontava que “sempre
exigentes, torcedores de outros clubes lamentaram a falta de grandes jogadas e
toques mágicos ao longo de uma partida transmitida pela TV para milhões de
espectadores em todo o planeta”, para em seguida ressaltar a apoteose que
foi a chegada da delegação tricolor à capital gaúcha: “Os gremistas não tinham do que se queixar: fiéis ao código das paixões
do futebol, eles improvisaram um carnaval em dezembro para festejar, em Porto
Alegre, o mais luminoso título já alcançado em toda a história do clube”. Traçando
uma analogia do futebol eficiente do Grêmio no Japão, no dia 11 de dezembro,
com o da seleção canarinho que brilhou na Espanha, mas não chegou ao título ao
perder para a Itália no estádio de Sarriá, em Barcelona, a 5 de julho de 82, a
revista sentenciou: “De que adianta
formar um time de artistas se a vitória não viera?”
O feito do Grêmio, 35 anos atrás, tinha também explicações
extra-campo, como destacou a publicação da Editora Abril, ao referir-se à
minuciosa preparação do escrete tricolor e à custosa – para a época –
infraestrutura que precedeu o confronto no Estádio Nacional de Tóquio: “Até que o zagueiro uruguaio Hugo de León,
capitão do Grêmio, pudesse levantar a taça em Tóquio, o time gaúcho teve de
cumprir uma dura, demorada trajetória, durante a qual se viu compelido a mexer
no time e nos cofres. O atacante Tita, por exemplo, um dos heróis da conquista
da Libertadores da América, em julho, foi requisitado pelo Flamengo, que o
emprestara ao Grêmio, e abriu vaga para o veterano Paulo César Caju,
responsável por uma bisonha atuação no jogo de Tóquio.
A preparação do Grêmio para a decisão em Tóquio havia durado
quatro meses, com um gasto de mais de 300 mil dólares, pagos pelos patrocinadores
japoneses, e incluía concentrar os jogadores em uma estância climática em
Gramado, importar teipes das partidas do Hamburgo e fretar um avião para levar
300 pessoas ao Japão.
Veja aproveitou a ocasião para entrevistar um gremista
ilustre que, já longe do poder, pouco falava com a imprensa – o ex-presidente
brasileiro, general Emílio Garrastazzu Médici, então com 78 anos. Médici
interrompeu o seu retiro de verão em Dom Pedrito, na campanha gaúcha, para
seguir de carro, em companhia da mulher, até Porto Alegre, onde, segundo
explicou, a televisão pegava bem melhor do que em sua fazenda. Gremista fiel, o
general torcia também pelo Flamengo, e pelo São Paulo, que naquele ano havia
perdido o título estadual para o Corinthians. Feliz e aliviado, Médici
considerou que “o jogo foi muito duro,
emocionante durante todo o tempo”, especialmente na prorrogação. Mas
comemorou: “Também não é brincadeira, o
Grêmio é campeão do mundo!”. E ainda alfinetou a torcida colorada: “O Inter só é campeão gaúcho porque o Grêmio
preferiu se poupar para o título mundial.” Para o ex-presidente do regime
militar, o Grêmio já tivera times melhores: “O dos últimos anos, por sinal, eram superiores ao atual”.
Com a taça de campeão mundial de clubes nas mãos, uma
comitiva gremista seguiu para Brasília no dia 29 de dezembro de 1983 a fim de
mostrar ao então presidente João Batista Figueiredo e ao chefe da casa civil da
presidência da República e conselheiro do Grêmio, Leitão de Abreu, o troféu conquistado
no Oriente. Estavam lá o novo presidente, Alberto Galia, o recém saído Fábio
Koff, o patrono Fernando Kroeff e o presidente do conselho deliberativo, Flávio
Obino, além de Pajheu Macedo Silva e Pedro da Silva Pereira.
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