1953, ano do futebol a
portas fechadas em Porto Alegre
Reprodução da Revista do Globo, publicação que durou de 1929 a 1967, editada em Porto Alegre. |
1953 foi um ano de ouro para o futebol gaúcho, brasileiro e
sul-americano. Ou, como escreveu Cid Pinheiro Cabral na Revista do Globo de 17
de outubro de 53, “foi o primeiro grande
ano para o futebol profissional de Porto Alegre”. Cabral, na reportagem
intitulada “Futebol a Portas Fechadas”,
comemorava: “Neste ano atinge o futebol
profissional de Porto Alegre uma prosperidade jamais sonhada”. Em seguida,
contudo, observou: “Infelizmente, a
popularidade alcançada está muito além da capacidade dos nossos estádios”.
O título da matéria “Futebol
a Portas Fechadas” era uma referência ao fato de que, pela primeira vez na
história futebolística da capital rio-grandense, parte dos torcedores que havia
comparecido aos estádios para assistir aos jogos não conseguira entrar, por
absoluto esgotamento da capacidade de acomodação nos diminutos e acanhados
centros esportivos de então. E prosseguia o cronista: “Antigamente, lá de vez em quando, fechavam os portões em Porto Alegre
antes das 14 horas. Mas isso só acontecia nos clássicos transcendentais, como
Grêmio X Internacional, realizados em estádios que mal comportavam 10 mil
pessoas. Em 1953, não. Em 1953, por ocasião do centésimo trinta Grêmio X
Internacional, os portões do estádio dos Eucaliptos, com 22.500 expectadores,
fecharam-se na cara de uns 2 mil a mais. E pela primeira vez isso aconteceu
também em outros jogos.” Cid destacava o fato de a disputa Internacional versus
Nacional (o da Chácara das Camélias) ter recebido cerca de 12 mil pessoas “em um estádio longínquo e sem acomodações,
e ficaram na rua 2 mil retardatários”. O fenômeno se repetiu em outra
partida – Internacional versus Força e Luz, o jogo do líder invicto contra o
último colocado. Também a partida entre Renner e Internacional teve lotação
esgotada.
Segundo o jornalista, “chegou,
portanto, a hora de Porto Alegre – a hora do futebol a portas fechadas. Por
paradoxal que pareça, futebol a portas fechadas quer dizer super popularidade.
E super popularidade, em linguagem profissionalista, é um estado de bem
aventurança.”
O fato do Grêmio estar quase concluindo as obras do Olímpico
chegava em excelente hora, festejava o cronista: “A sorte de Porto Alegre é que o estádio do Grêmio Porto-alegrense,
que abrigará, concluída a primeira parte do projeto, umas 35 mil pessoas, está
andando a passos de gigante. A sorte é que o Internacional, cujo estádio na
situação atual, apanha no máximo 23 mil pessoas, promete para breve uma nova
forçada, no sentido de concluir o seu pavilhão central, o que ampliará em 12
mil a sua capacidade.”
É importante salientar que o futebol no Rio Grande do Sul, em
1953, tinha apenas meio século anos de existência esportiva e que só haviam
sido realizadas quatro copas do mundo. Em todo o mundo, aliás, pela primeira
vez se descobrira que ele, à exceção de alguns países, era agora o esporte mais
popular de todos, superando o boxe, o remo e até o turfe.
Logo na abertura da sua matéria, Cid Pinheiro Cabral diz:
“Positivamente, a loucura do futebol chega ao auge”, lembrando que, durante a
construção do Maracanã, muitos dos seus idealizadores estimavam que o hoje
Maraca só lotaria dali a muitos anos, o mesmo acontecendo com o Pacaembu, este com
capacidade para 80 mil pessoas. E no entanto os dois já tinham lotado seus
jogos muitas vezes nos últimos anos.
O fenômeno não era brasileiro e sim sul-americano, apontava o
jornalista: “Eis que agora começa o
problema a afligir também os mentores do futebol uruguaio, argentino e chileno.
O Estádio Municipal de Santiago, remodelado em 1945 para o Campeonato
Sul-Americano (atual Copa América), não corresponde mais ao interesse que está
despertando, no Chile, o mais popular dos esportes.”
E prosseguia em sua matéria na Revista do Globo daquele ano
de 53: “A Argentina tem dois grandes
estádios recentemente construídos – o do Racing e o do Huracan. Mas ainda o do
River Plante conserva a primazia. É o mais amplo mas começa a tornar-se
pequeno. Mas também o velho estádio Centenário, inaugurado em Montevidéu por
volta de 1930 sem estar concluído, torna-se objeto de atenção dos dirigentes do
futebol uruguaio. Já não comporta mais o interesse que certas temporadas
internacionais começam a despertar e por isso vai ser ampliado em mais 30 mil
lugares.”
Fechando sua matéria “Futebol
a Portas Fechadas”, Cid Pinheiro Cabral ironizava, um tanto acidamente: “Ao depararmos com esse espetáculo – que é
continental – da luta da popularidade do futebol contra a relativa exiguidade
dos estádios, lembramo-nos daqueles apressados e mal inspirados profetas que,
por volta de 1933-34, preconizavam o fim do futebol no Brasil por haver
cometido o imperdoável pecado de profissionalizar-se. Paz à alma dos que já
morreram.”
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