sábado, janeiro 31, 2009

Ghandi no Forum Social Mundial


Maristela Bairros

Passeio pelo noticiário brasileiro e o Fórum Social Mundial tem destaque. Aquele fuzuê de sempre, só que agora em Belém, com direito a coreografia de nossos silvícolas para encantar ainda mais os estrangeiros que, com maior ou menor sinceridade, estão na reunião iniciada aqui em Porto Alegre bandereando o slogan “um outro mundo é possível”. Nunca acreditei no Fórum e nunca vou acreditar. Acho que é um Woodstock de uma ideologia cheia de ideais e pouca prática. Termina o acampamento, os namoros, a “integração” entre os povos, os coletivos, este monte de gueto que se junta para “mudar o planeta” e volta tudo ao que era antes.
Trabalhei com uma jornalista muito boa gente que vivia para o Fórum. Esperava por ele como quem espera pela chegada do filho mais amado, do amante mais especial. Ficava torcendo para ter “gente” em casa, como se não bastasse a pilha de familiares que se agrupava em seu humilde quarto e sala. O que importava era fazer parte, ser do Fórum, mesmo sem ouvir nada direito, sem participar de uma palestra inteira, em fazer maratona de uma barraca para outra ou de uma sala para outra para ouvir “autoridades” mundiais em qualquer assunto.
Agora, o povo está lá no Norte. Deslumbramento total num cenário que, de uma hora para outra, esqueceu da miséria nativa, dos conflitos, porque, claro, é cenário.
Queria muito saber o que um cara em especial faria se vivo e ativo estivesse nessa época de Fórum Social Mundial:
Mohandas Gandhi, cuja morte está completando, neste 30 de janeiro, 61 anos. Um sujeito dazelite, que conseguiu estudar em Londres, tinha um carisma natural a ponto de agregar em torno dele até quem queria deixar de comer carne e virar vegetariano e, claro, era um líder de competência acima da média.
Bebeu na fonte de
Henry Thoreau, cujas hoje em parte questionáveis regras de desobediência civil foram uma forma de protesto na época que era, na verdade, uma sementinha da sociedade globalizada que viria em seguida. Assim como Gandhi, tantos outros beberam da mesma água do autor de Walden.
Mas, enfim, eu falava de minha curiosidade em saber da reação de Gandhi diante do FSM que termina neste domingo. Imaginemos o velho miúdo, careca, teimosamente calmo (e, algumas vezes, paciente), desfilando com sua túnica, descalço, em meio àquela turba de garotos festeiros, de branquelos vindos de países sem sol espantados com tanta cor, de gente muiiiiiiiito desocupada, desempregada ou esperta demais a ponto de conseguir ou férias ou licença para tratar de fazer um outro mundo. De preferência na barraca ao lado.
Será que Gandhi acharia bonito? Será que andariam seguindo Gandhi ou o confundiriam com um hare krishna e lhe dariam um sorriso complacente do tipo “ih, sai, tio alienado”? Será que o governo de Lula o cooptaria para ser uma espécie de porta-voz da candidatura de Dilma Paz e Amor? E ele aceitaria?
Digressões da última sexta-feira do primeiro mês de 2009, numa Porto Alegre meio vazia, descarregando carros e mais carros na free way para os embalos de sábado à noite de Capão e Atlântida. E o novo mundo possível parece que
está aí, no anúncio da queda do PIB do Grande Irmão do Norte, logo acima ali de Belém, onde a turma passeia, faz a terapia do abraço, canta e dança, reclama dos ricos, aplaude os índios, faz de conta que tolera os mendigos na rua e, depois, vai pra casa, cheia de fotos e mails para, quem sabe, um dia, mandar uma mensagem e falar sobre o exotismo deste país chamado Brazil. (Coletiva.Net)

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