Ernani Ssó
Todo mundo pensava que os neandertais tinham desaparecido por estupidez. Mas, analisando os artefatos de pedra construídos por eles, os cientistas afirmam que eram tão bons quanto os dos homo sapiens. Foi por terra a minha tese: eu achava que os neandertais tinham sumido porque só ficavam lendo os blogs uns dos outros.
Romeu neandertal, Julieta sapiens
Muito se discutiu sobre a convivência, de dez mil anos, dos homens modernos com os neandertais. Será que não houve nenhum Romeu e Julieta? Em romances populares, como os da série de Jean M. Auel sobre Ayla, uma mulher das nossas criada por um clã neandertal, a coisa é tórrida. Ayla é desprezada, estuprada, espancada e quantos adas mais você puder pensar. Teve até um filho, uma abominação meio sapiens, meio neandertal. Mas testes de DNA melaram a fantasia da Auel: nenhum de nós tem genes neandertais. Melaram? Não inteiramente, me parece. É como os casos de galpão aqui do sul: a inexistência dos centauros não elimina o grande amor do gaúcho por seus animais de estimação.
Um sério profissional
Sartre achava que o mundo podia passar muito bem sem literatura. Não sei quando ele disse isso, mas deve ter sido na fase politizada. Todo sujeito recém convertido diz alguma idiotice desse naipe. O mundo nunca passou sem literatura. A primeira coisa que o homem fez depois de aprender a falar foi contar histórias. Se Sartre dissesse que o mundo pode passar sem livros, tudo bem. Mas não passa sem ficção. Não importa se escrita, filmada ou contada.
Deu no jornal
“Novas razões médicas para investir numa vida sexual ativa.” Cansei de manchetes desse tipo. Por que temos de justificar o prazer, como se ainda fosse necessário prestar contas ao papa ou algum outro maníaco de plantão? Sexo só pra procriar ou pra evitar infarto. Comida pra alimentar, de preferência uma gororoba sem gosto ou com gosto detestável. Literatura com mensagem, pra sermos bons meninos, nada de aventuras eletrizantes e sutilezas estilísticas. Ensino como uma espécie de palmatória no lombo, nada a ver com a alegria e a paixão da curiosidade. Comigo não: nasci sem o pecado original, não sinto culpa por estar vivo, conhecida como síndrome de estar ocupando indevidamente esse buraco no ar.
Academia Brasileira de Letras
Esses dias me lembrei da proposta do Barão de Itararé para a Academia Brasileira de Letras. Pra diminuir um pouco a concorrência — a torcida pela morte dos colegas —, ele propunha que a academia funcionasse como os ônibus: quarenta acadêmicos sentados, quarenta de pé. Acho que podiam modernizar outras coisas também. Como estamos nos trópicos, que tal trocar o fardão por uma camisa havaiana e o chá por água de coco? Em vez de um espadim, um sabre de luz, autografado pelo George Lucas. A vantagem do sabre é que teria outras utilidades além das decorativas. Já vejo a cena: Sarney aparando aquele bigodinho com o sabre de luz: djjjizzzz, djjjizzz. Impagável.
Oficina literária
Sempre que penso em montar uma oficina literária, topo com notícias como esta, que Ivan Lessa deu na sua coluna na BBC-Brasil: “no Reino Unido são editados cerca de 200 mil títulos novos de livros por ano. Duro ser editor, duro ser editado, duro, muito mais duro, ser leitor”.
Adequação da linguagem
Não sei se vocês se deram conta, mas políticos e demais autoridades que em entrevistas usam o mais perfeito juridiquês e economês — quer dizer, obscuro e pomposo —, nos telefonemas grampeados usam o português cristalino das ruas: “Eu te passo a bola, mas você tem de depositar logo o meu”. (Coletiva.Net)
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