*A privação do afeto e de cuidados básicos deixa marcas para toda a vida. Adultos com depressão que sofreram negligência na infância apresentam prejuízos na memória e diminuição no sangue do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, responsável pelo crescimento neuronal). Essa é uma das conclusões do estudo premiado no Congresso da International Society of Traumatic Stress Studies, realizado em Chicago (EUA) no final de 2008, e publicado na Biological Psychiatry (EUA). O trabalho é fruto da tese de doutorado do professor da Faculdade de Psicologia e psiquiatra Rodrigo Grassi de Oliveira, defendida no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS. Ele obteve da Capes a bolsa PDEE (Programa de Doutorado no País com Estágio no Exterior) para ficar dez meses na Universidade de Harvard, onde foi orientado por Martin Teicher.
A negligência física é a privação de cuidados básicos, como higiene e alimentação. Grassi diz que se trata de uma forma negativa de trauma, silenciosa e crônica. Lembra que não apenas os maus-tratos em forma de abusos leva a consequências na vida adulta. A negligência é capaz de interferir no funcionamento da memória. Grassi adverte, porém, que sequelas cerebrais só poderiam ser confirmadas por estudos de neuroimagem e interação gene-ambiente.
Segundo a professora Lilian Stein, que orientou a tese e também é autora do artigo, o estudo sugere que a negligência pode afetar o desenvolvimento cognitivo, mas seriam necessárias mais investigações para corroborar os resultados. Diz que há poucas pesquisas sobre negligência, diferentemente da violência. "A negligência emocional é mais sutil. Não choca como um ferimento e também deixa marcas", constata a professora, lembrando que os efeitos são sentidos a longo prazo.
Para a pesquisa foram selecionadas pacientes do Ambulatório de Depressão do Hospital Presidente Vargas com e sem histórico de negligência na infância. Foram entrevistadas 60 mulheres por psiquiatras. A seleção de apenas pessoas do sexo feminino visou a um melhor controle sobre os resultados, pois o impacto das experiências estressantes na infância pode diferenciar-se entre homens e mulheres. As pacientes foram comparadas com grupo saudável sem experiência de maus-tratos.
Elas foram submetidas a testes de memória e exames de sangue para verificar o nível de BDNF, além de responderem a questionários. Era esperado que essa substância estivesse diminuída em pacientes com depressão, mas surpreendeu os pesquisadores o fato de as pessoas com histórico de negligência apresentarem nível ainda mais baixo de neutrofina (substância que guia os neurônios em diferentes funções, contribuindo para o seu crescimento). A redução estava correlacionada a prejuízos da memória. "O BDNF pode ser um marcador importante da relação entre transtornos do humor e maus-tratos na infância, o que poderá, no futuro, ajudar a definir intervenções farmacológicas", diz Grassi.
O trabalho tem também a participação de Moisés Bauer (Biociências da PUCRS), Antonio Teixeira (Medicina da UFMG) e Rodrigo Lopes (doutorando). Foi realizado em colaboração com o Laboratório de Imunologia do Estresse do Instituto de Pesquisas Biomédicas da PUCRS. Financiada pelo CNPq e Capes, a pesquisa faz parte da nova área de concentração do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS - Cognição Humana.
Outro projeto do CNPq coordenado por Grassi prevê a análise genética do BDNF e cortisol (hormônio do estresse) em 130 crianças em idade escolar acompanhadas desde o nascimento pela equipe da médica Olga Falceto (Hospital de Clínicas). O objetivo será avaliar a associação entre cuidado materno, BDNF, estresse e desenvolvimento cognitivo.As bases do desenvolvimento Infantil
Estudos com roedores separados das mães quando filhotes mostram alterações neurobiológicas na vida adulta. A exposição precoce ao estresse na infância induziria modificações também nos seres humanos. Segundo Rodrigo Grassi de Oliveira, pesquisas concluem que essas mudanças seriam respostas adaptativas na tentativa de habituar os indivíduos a elevados níveis de privação. Nos dois primeiros anos de vida, está aumentada a atividade neutrófica. O desenvolvimento neurológico depende das influências ambientais (mais do que em outras fases), quando há maior plasticidade neuronal: as conexões não utilizadas são "podadas". "Se estiverem ausentes toque, conversa e afeto, as conexões sinápticas responsáveis por esses estímulos serão interpretadas como inúteis e eliminadas", explica. Segundo Grassi, imagina-se que uma criança privada de afeto e cuidado precisa lançar mão das habilidades de coping (capacidade de enfrentar uma situação estressante) precocemente. Com o acúmulo do estresse esse sistema ficaria sobrecarregado até não responder mais, contribuindo para as alterações do desenvolvimento.
A negligência física é a privação de cuidados básicos, como higiene e alimentação. Grassi diz que se trata de uma forma negativa de trauma, silenciosa e crônica. Lembra que não apenas os maus-tratos em forma de abusos leva a consequências na vida adulta. A negligência é capaz de interferir no funcionamento da memória. Grassi adverte, porém, que sequelas cerebrais só poderiam ser confirmadas por estudos de neuroimagem e interação gene-ambiente.
Segundo a professora Lilian Stein, que orientou a tese e também é autora do artigo, o estudo sugere que a negligência pode afetar o desenvolvimento cognitivo, mas seriam necessárias mais investigações para corroborar os resultados. Diz que há poucas pesquisas sobre negligência, diferentemente da violência. "A negligência emocional é mais sutil. Não choca como um ferimento e também deixa marcas", constata a professora, lembrando que os efeitos são sentidos a longo prazo.
Para a pesquisa foram selecionadas pacientes do Ambulatório de Depressão do Hospital Presidente Vargas com e sem histórico de negligência na infância. Foram entrevistadas 60 mulheres por psiquiatras. A seleção de apenas pessoas do sexo feminino visou a um melhor controle sobre os resultados, pois o impacto das experiências estressantes na infância pode diferenciar-se entre homens e mulheres. As pacientes foram comparadas com grupo saudável sem experiência de maus-tratos.
Elas foram submetidas a testes de memória e exames de sangue para verificar o nível de BDNF, além de responderem a questionários. Era esperado que essa substância estivesse diminuída em pacientes com depressão, mas surpreendeu os pesquisadores o fato de as pessoas com histórico de negligência apresentarem nível ainda mais baixo de neutrofina (substância que guia os neurônios em diferentes funções, contribuindo para o seu crescimento). A redução estava correlacionada a prejuízos da memória. "O BDNF pode ser um marcador importante da relação entre transtornos do humor e maus-tratos na infância, o que poderá, no futuro, ajudar a definir intervenções farmacológicas", diz Grassi.
O trabalho tem também a participação de Moisés Bauer (Biociências da PUCRS), Antonio Teixeira (Medicina da UFMG) e Rodrigo Lopes (doutorando). Foi realizado em colaboração com o Laboratório de Imunologia do Estresse do Instituto de Pesquisas Biomédicas da PUCRS. Financiada pelo CNPq e Capes, a pesquisa faz parte da nova área de concentração do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS - Cognição Humana.
Outro projeto do CNPq coordenado por Grassi prevê a análise genética do BDNF e cortisol (hormônio do estresse) em 130 crianças em idade escolar acompanhadas desde o nascimento pela equipe da médica Olga Falceto (Hospital de Clínicas). O objetivo será avaliar a associação entre cuidado materno, BDNF, estresse e desenvolvimento cognitivo.As bases do desenvolvimento Infantil
Estudos com roedores separados das mães quando filhotes mostram alterações neurobiológicas na vida adulta. A exposição precoce ao estresse na infância induziria modificações também nos seres humanos. Segundo Rodrigo Grassi de Oliveira, pesquisas concluem que essas mudanças seriam respostas adaptativas na tentativa de habituar os indivíduos a elevados níveis de privação. Nos dois primeiros anos de vida, está aumentada a atividade neutrófica. O desenvolvimento neurológico depende das influências ambientais (mais do que em outras fases), quando há maior plasticidade neuronal: as conexões não utilizadas são "podadas". "Se estiverem ausentes toque, conversa e afeto, as conexões sinápticas responsáveis por esses estímulos serão interpretadas como inúteis e eliminadas", explica. Segundo Grassi, imagina-se que uma criança privada de afeto e cuidado precisa lançar mão das habilidades de coping (capacidade de enfrentar uma situação estressante) precocemente. Com o acúmulo do estresse esse sistema ficaria sobrecarregado até não responder mais, contribuindo para as alterações do desenvolvimento.
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