Por Luiz Antonio Magalhães
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve ter acordado invocado na terça-feira (10/02). Discursando para quase 4 mil prefeitos brasileiros, ele criticou duramente a imprensa brasileira e reclamou da cobertura dos jornais do dia anterior, acusando a mídia de ter deturpado o sentido do evento com os prefeitos. "Fiquei triste como leitor porque estão abusando de minha inteligência. Tem gente que pensa que o povo é marionete, é vaca de presépio. Disseram que este ato eu ia fazer o pacote da bondade e que o presidente vai dar dinheiro para prefeito bandido. Como é fácil julgar as pessoas. Não deram nem sequer a oportunidade para vocês [prefeitos] mostrarem que não são os ladrões que escrevem que vocês são", afirmou Lula.
O presidente também acabou desmentindo, durante o discurso, uma de suas frases célebres, que até já virou mote quando ele é perguntado sobre as suas relações com a mídia: "eu só sou o que sou por causa da imprensa". Aos prefeitos, Lula disse algo bem diferente: "Nunca fui eleito porque a imprensa me ajudou. Fui eleito porque gastei gota de suor para enfrentar o ódio dos de cima contra os de baixo. Eu posso perder a minha postura, mas não perco o meu caráter nem a minha vergonha".
Uma análise mais detida das palavras do presidente, porém, revela que a contradição entre os vários discursos – não é a primeira e certamente não será a última vez que Lula critica veículos de comunicação – é apenas aparente. De fato, Lula só é o que é por causa da imprensa e isto significa que ele sabe usar como poucos políticos a exposição pública a seu favor. O presidente é muito criticado pela oposição "por nunca ter descido do palanque", mas qualquer deputado de primeira legislatura sabe que a política não é outra coisa senão uma campanha permanente. Em algumas situações, é claro, a boa tática recomenda o recolhimento, mas é da natureza dos homens públicos, especialmente dos que disputam os cargos de maior importância, a busca pela maior exposição possível na mídia. E Lula faz isto como realmente poucos, talvez apenas Getúlio Vargas e Jânio Quadros possam ser comparados ao líder petista.
Presidente observador da imprensa
Por outro lado, o presidente gosta de se comportar, em diversas ocasiões, como analista e crítico da imprensa. É evidente que esta postura também é um jeito de fazer política – legítimo, por sinal. O ex-operário que chegou ao Palácio do Planalto tem muita razão ao dizer que venceu as duas eleições presidenciais sem ajuda da imprensa. É verdade, desde 1982 a imprensa brasileira acompanha a trajetória do atual presidente com um misto de preconceito e bajulação, e de lá para cá a dose do primeiro tem diminuído, mas permanece preponderante. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, sempre contou com apoio coeso dos proprietários dos veículos de comunicação, que ajudaram a elegê-lo, como também ajudaram Fernando Collor (depois derrubado com apoio entusiástico da imprensa nacional, diga-se de passagem).
Lula, ao contrário, sempre contou com a oposição, mais ou menos velada, do patronato da imprensa. Após chegar ao poder e realizar um governo muito menos "petista", para dizer o mínimo, do que se imaginava, o presidente conseguiu neutralizar a oposição mais histérica de certos veículos, mas realmente não conta com apoio ou simpatia neste setor.
Ao exibir o seu lado "observador da imprensa", Lula presta um grande serviço à sociedade brasileira porque obriga os jornalões a publicarem... crítica de mídia. O presidente também se mostra bastante perspicaz ao dizer que o povo "não é marionete" e julga os fatos a despeito do que aparece na imprensa. As duas eleições presidenciais vencidas pelo PT de certa forma corroboram esta análise e a perspicácia de Lula está em apontar a evidente contradição entre a maneira com que as notícias são divulgadas e o modo como a opinião pública lê essas mesmas notícias. Até aqui, aparentemente, a grande imprensa não tem sido feliz em tentar convencer os brasileiros de que o atual governo é desastroso e que o presidente é um bravateiro, populista, ou coisa do gênero.
Tudo somado, não há nada de ruim no "Lulinha bate e assopra". É perfeitamente compreensível que ele elogie a imprensa, atribua seu sucesso à exposição que obteve (também é fruto do seu próprio suor) e que faça críticas até virulentas quando se sente prejudicado pelo que sai no noticiário. Do ponto de vista do avanço da democracia brasileira, quanto mais se discutir o comportamento da mídia, melhor. (Observatório da Imprensa)
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