sábado, julho 21, 2018


1953, ano do futebol a portas fechadas em Porto Alegre

Reprodução da Revista do Globo, publicação que durou de 1929 a 1967, editada em Porto Alegre.


1953 foi um ano de ouro para o futebol gaúcho, brasileiro e sul-americano. Ou, como escreveu Cid Pinheiro Cabral na Revista do Globo de 17 de outubro de 53, “foi o primeiro grande ano para o futebol profissional de Porto Alegre”. Cabral, na reportagem intitulada “Futebol a Portas Fechadas”, comemorava: “Neste ano atinge o futebol profissional de Porto Alegre uma prosperidade jamais sonhada”. Em seguida, contudo, observou: “Infelizmente, a popularidade alcançada está muito além da capacidade dos nossos estádios”.
O título da matéria “Futebol a Portas Fechadas” era uma referência ao fato de que, pela primeira vez na história futebolística da capital rio-grandense, parte dos torcedores que havia comparecido aos estádios para assistir aos jogos não conseguira entrar, por absoluto esgotamento da capacidade de acomodação nos diminutos e acanhados centros esportivos de então. E prosseguia o cronista: “Antigamente, lá de vez em quando, fechavam os portões em Porto Alegre antes das 14 horas. Mas isso só acontecia nos clássicos transcendentais, como Grêmio X Internacional, realizados em estádios que mal comportavam 10 mil pessoas. Em 1953, não. Em 1953, por ocasião do centésimo trinta Grêmio X Internacional, os portões do estádio dos Eucaliptos, com 22.500 expectadores, fecharam-se na cara de uns 2 mil a mais. E pela primeira vez isso aconteceu também em outros jogos.” Cid destacava o fato de a disputa Internacional versus Nacional (o da Chácara das Camélias) ter recebido cerca de 12 mil pessoas “em um estádio longínquo e sem acomodações, e ficaram na rua 2 mil retardatários”. O fenômeno se repetiu em outra partida – Internacional versus Força e Luz, o jogo do líder invicto contra o último colocado. Também a partida entre Renner e Internacional teve lotação esgotada.
Segundo o jornalista, “chegou, portanto, a hora de Porto Alegre – a hora do futebol a portas fechadas. Por paradoxal que pareça, futebol a portas fechadas quer dizer super popularidade. E super popularidade, em linguagem profissionalista, é um estado de bem aventurança.”
O fato do Grêmio estar quase concluindo as obras do Olímpico chegava em excelente hora, festejava o cronista: “A sorte de Porto Alegre é que o estádio do Grêmio Porto-alegrense, que abrigará, concluída a primeira parte do projeto, umas 35 mil pessoas, está andando a passos de gigante. A sorte é que o Internacional, cujo estádio na situação atual, apanha no máximo 23 mil pessoas, promete para breve uma nova forçada, no sentido de concluir o seu pavilhão central, o que ampliará em 12 mil a sua capacidade.”
É importante salientar que o futebol no Rio Grande do Sul, em 1953, tinha apenas meio século anos de existência esportiva e que só haviam sido realizadas quatro copas do mundo. Em todo o mundo, aliás, pela primeira vez se descobrira que ele, à exceção de alguns países, era agora o esporte mais popular de todos, superando o boxe, o remo e até o turfe.
Logo na abertura da sua matéria, Cid Pinheiro Cabral diz: “Positivamente, a loucura do futebol chega ao auge”, lembrando que, durante a construção do Maracanã, muitos dos seus idealizadores estimavam que o hoje Maraca só lotaria dali a muitos anos, o mesmo acontecendo com o Pacaembu, este com capacidade para 80 mil pessoas. E no entanto os dois já tinham lotado seus jogos muitas vezes nos últimos anos.
O fenômeno não era brasileiro e sim sul-americano, apontava o jornalista: “Eis que agora começa o problema a afligir também os mentores do futebol uruguaio, argentino e chileno. O Estádio Municipal de Santiago, remodelado em 1945 para o Campeonato Sul-Americano (atual Copa América), não corresponde mais ao interesse que está despertando, no Chile, o mais popular dos esportes.”
E prosseguia em sua matéria na Revista do Globo daquele ano de 53: “A Argentina tem dois grandes estádios recentemente construídos – o do Racing e o do Huracan. Mas ainda o do River Plante conserva a primazia. É o mais amplo mas começa a tornar-se pequeno. Mas também o velho estádio Centenário, inaugurado em Montevidéu por volta de 1930 sem estar concluído, torna-se objeto de atenção dos dirigentes do futebol uruguaio. Já não comporta mais o interesse que certas temporadas internacionais começam a despertar e por isso vai ser ampliado em mais 30 mil lugares.”
Fechando sua matéria “Futebol a Portas Fechadas”, Cid Pinheiro Cabral ironizava, um tanto acidamente: “Ao depararmos com esse espetáculo – que é continental – da luta da popularidade do futebol contra a relativa exiguidade dos estádios, lembramo-nos daqueles apressados e mal inspirados profetas que, por volta de 1933-34, preconizavam o fim do futebol no Brasil por haver cometido o imperdoável pecado de profissionalizar-se. Paz à alma dos que já morreram.”

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