segunda-feira, setembro 21, 2020

Pedro Simon e o meu primeiro voto


  • Há questão de uns dois anos, naquele período entre o Natal e o Reveion, caminhando pela avenida Protásio Alves, aqui em Porto Alegre, cruzei com Pedro Simon, que vinha em sentido contrário - do lado ao antigo cinema Ritz (foi lá que vi a Laranja Mecânica, quando do seu lançamento, com bolinhas e tudo) para a loja Salém, onde, em cima, tem residência, ao lado da igreja de São Sebastião. Vinha de cabeça baixa, com as mãos nos bolsos, elegantemente vestido e com a seriedade meditativa da sua idade. Afinal, completou 90 anos em janeiro. Eu nem sequer imagino o que seja isso. Fisicamente me pareceu em excelente forma e lhe daria tranquilamente uns 15 ou 20 anos a menos. Lembrei então dele, quando o vi pela primeira vez em pessoa, em comício no salão paroquial da pequenina cidade de Santo Augusto, a 450 quilômetros de Porto Alegre, naquela campanha eleitoral de 1974. Na ocasião o MDB aplicou uma surra na Arena, vencendo as eleições em 16 Estados brasileiros - não havia voto direto para governador neste período autoritário. 
  • Eu tinha 13 anos e fui lá especialmente para vê-lo. Decepcionei-me, à primeira vista, com a sua estatura física - tão baixinho, ainda mais do que eu, quase insignificante. Mas, meus amigos, quando o homem começou a falar foi como se uma onda magnética atravessasse a multidão. À oratória candente se combinavam os gestos e uma fúria de pastor evangélico, de Antonio Conselheiro no sertão de Canudos. Em 1982 viajei oito horas de ônibus especialmente para votar em Simon, nas primeiras diretas para governador. Foi o meu primeiro voto, aos 21 anos. Ele era o franco-favorito, o cavalo mais cotado do páreo, e se dava quase certa, até pelo governo militar, a sua eleição. Mas perdeu na contagem final, dizem, por fraude, já que havia reconhecido a derrota antes da hora e propiciou uma roubalheira enorme nas urnas - os fiscais  do MDB, todos, abandonaram seus postos. Não foi isso a causa, porém, e sim os votos que Collares lhe tirou, dividindo a oposição. Depois candidatou-se de novo, foi eleito e fez um governo bem meia-boca. Na verdade, era um grande tribuno e não um homem para o executivo. 
  • Pedro Simon tem agora 90 outonos nas costas e está fora do mundo político. Na rua, passou por mim calado e elegante, uma longa história política em um corpo franzino. Um democrata, a experiência e a eloquência em pessoa, um símbolo de um Brasil que, quando a gente pensa, nem sabe mais o que pensar. Quanto ao menino de 13 anos, esse agora só existe na casca do ovo.