sábado, novembro 27, 2010

Cuidado com as escadas, escadas são perigosas, escadas fazem mal.
É um sábado de sol, e muita gente está consertando coisas no telhado. Estão trepando, estão subindo as escadas, estão sujeitos aos seus caprichos.
Escadas pregam peças, escadas derrubam, escadas - coisas banais, prosaicas, inermes - até destroem vidas.
Foi o caso de A., que já foi meu amigo. Tornou-se repórter fotográfico renomado em São Paulo e nunca mais nos falamos. Coisas da vida, não importa. Foi é passado.
Um dia me ligam e contam que ele sofreu um acidente, está entre a vida e a morte: ia ajudar a consertar o telhado da casa de um parente e caiu da escada, a três metros de altura. Bateu com a cabeça e sifu, obviamente.
Vi um vídeo dele no youtube. Voltou a ser criança.
Outro conhecido, aqui de perto, fez a mesma coisa, só que no serviço. Também caiu e também bateu a cabeça. Era um cara forte, alegre, com voz poderosa e sempre muito disposto. Hoje está um caco. No hospital, pra piorar, teve meningite. Desgraça pouca é bobagem.
Isso tudo em questão de dois anos. É por isso que eu penso dez vezes antes de subir numa escada. A lei da gravidade é muito cruel, prefiro me manter na superfície.
Ah, minha invocação é com esses sujeitos de rádio e televisão que dizem "bastante" pra tudo.
Ninguém mais quer dizer "muito" - agora é "bastante". Bastante bom, bastante ruim, bastante chuvoso, bastante engarrafado.
Isso começou de uns dois, três anos para cá, e se espalhou como uma praga.
Bastante, pelo que eu sei, é o que basta, o suficiente. Então "bastante ruim" é suficientemente ruim. Que tal?
E o "veja bem"? Esse consegue ser ainda pior. Lembro do Joel Santana, o técnico da prancheta, que começava toda entrevista com um "veja bem".
Em bares populares a gente conhece cada figura, embora todas se pareçam - é o povão, os bêbados, os desajustados, nós todos.
Entendo do assunto. Mas muitas vezes a gente se surpreende com uma figura a quem não dávamos a mínima importância - mais um ali, analfabeto funcional, falando de futebol e de crimes, igual todos os outros.
Foi o caso de Y., um mulato de uns sessenta e poucos anos, que joga sinuca - sinuqueiro bom traz o seu taco - e que nunca vi beber naquele bar da avenida. É da casa, conhece e é conhecido por todos, não fala muito - o negócio dele é a mesa de pano.
Não é que, de uma hora pra outra, descobri que o sujeito é grande conhecedor da história rio-grandense. Não é um atochador, um mentiroso, não: conhece bem, bem melhor do que eu. Começou a falar sobre maragatos e chimangos, Borges de Medeiros, Julio de Castilhos, Flores da Cunha. Acertou tudo. Mas não falava em tom professoral, se achando. Me disse que é maragato. Falamos sobre flores da Cunha, que aprisionou Honório Lemes.
Vê só. Eu achando que o cara era mais um mané de bar, daqueles que só lêem o Diário Gaúcho, e ainda assim não entendem o que está escrito. Engano e boa surpresa.
Ah, e surgiu outro, que também não falava comigo. Agora fala, estabelecemos uma relação de camaradagem. É policial militar aposentado e trabalhou no DOPS e na repressão. Conhece os torturadores todos e se diz, diretamente, de direita.
Em uma País onde ninguém quer ser de direita, ele diz que é, e pronto.
Gosta de leitura e sofreu um derrame. Outra hora falo dele.
Caramba! De repente tenho dois seguidores, ou duas seguidoras, sem lá.
Gostei da foto da primeira. Será que ela me segue mesmo?
Eu, que merda, não sigo ninguém.
A. tem 26 anos e uma irmã de 16. A. é uma nega linda, e sabe disso. Dizem que, não faz muito, parava o Morro de Santa Teresa quando subia. Quem me disse isso foi um polícia, que eu nem sabia que era polícia, num bar da avenida.
Ela estava comigo, radiante, brilhosa. É uma mulher cheia de vida, sem nenhuma grana, que vive como dá - fazendo programas, pedindo, às vezes achacando, essas coisas. É viciada em crack, ao contrário da irmã menor, que também faz programa, também faz as coisas que a outra faz, mas não fuma, não bebe (de vez em quando uma cerveja), mas frequenta os bares pé-sujo.
A. é mais bonita que a menor - que, por sua vez, é também uma nega muito bonita. A. sabe que é bonita. Tem classe, voz agradável, sabe conversar, sabe rir, não é vulgar. Eu disse a ela: "Cuidado, garota, que a beleza acaba".
Ela tem o rosto perfeito - se alguém do ramo a tivesse descoberta anos atrás, certamente seria modelo. É alta, corpo esguia e, apesar de todos os excessos, tem a pele perfeita. Tem furinhos no queixo - puro charme - e um sorriso que antigamente se chamava de "alvar".
Nega cor de ébano. Mas anda por aí, dando pra todo mundo, pra sustentar o vício. Vi ela fumando pedra: em vez de ficar alegre e extrovertida, ou falante, entra numa triste neura, acha que todos a perseguem e que todos são polícia.
Usa uma boina, estilo Che Guevara. Se eu tivesse uma boa grana sobrando, vestia essa nega com os melhores panos e mentia a todos que ela era uma modelo internacional. No meu entender, é mais bonita que a Naomi Campbell. Chama a atenção.
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O Bahia voltou á primeira divisão do futebol brasileiro, depois de sete anos.
Morei - no início dos anos oitenta - próximo ao estádio da Fonte Nova (implodido, me parece) e lembro dos jogos do tricolor. A massa, em peso, tomava as ruas, num frenesi incrível, gente de toda a periferia de Salvador, fanáticos.
Naquela época Salvador tinha os "morcegos" que, acredito, não mais existam, pelo menos em quantidade. Eles se penduravam atrás dos ônibus, ou mesmo em cima, no capô, uma carona perigosa que muitas vezes terminava em morte.
Pouca gente pagava passagem no transporte coletivo de Salvador então. Era entrar, fazer um sinal para o cobrador, deixar a metade do valor da passagem nas mãos dele, e passar por debaixo da roleta, ou então por cima. Só os mais velhos e respeitosos pagavam a passagem integral. Grande parte - a garotada - embarcava na porta de trás (era a porta de embarque) e saía por ali, de fininho, na parada que desejasse, sem passar a roleta. Os cobradores não estavam nem aí.
Acho que as empresas de ônibus só não faliram porque, em troca, ofereciam um péssimo serviço, com ônibus velhos e superlotados. A rigor, não havia transporte coletivo urbano digno desse nome na capital baiana.
Como será que está hoje? Há tempos - uns quinze anos - não volto à Bahia. Imagino que a cidade esteja enorme, bonita, colorida.
Ah, e a noite da Bahia, com aquelas nuvens brancas contra a escuridão azulada do céu, a brisa, o cheiro de mar. E a cerração oceânica, na orla. E o porto da Barra - delícia que curti muito, nadando até a zona do Iate Clube. Águas mansas, tépidas, com uma temperatura média de 30 graus.
Imagine então agora as nossas praias aqui do Sul - do Rio Grande do Sul, melhor falando. Praias não - litoral. Praia é em Santa Catarina, não no Rio Grande. Ver aquela água cinzenta, suja de algas, fria e agitada, me faz olhar com ironia - e até um certo desprezo - para essa gente que veraneia por aqui. É muita falta de gosto - ou conformismo, ou exigir muito pouco.
Além de tudo uma hora a gente quer não ver gaúchos. Vemos gaúchos - nós gaúchos - o ano todo, e ainda vamos ver gaúcho durante as férias? Ah, é preciso uma trégua. Somos isolados demais, precisamos de mais convívio alienígena.
Aliás, gaúcho na praia é uma coisa esquisita e anômala - calções imensos, pele branca que há dez meses que não pega sol, um jeito desajeitado, uma estranheza com a areia, o sol e o mar.
E os argentinos, então: bom, acho que abandonaram aquele hábito ridícula de andar de meia soquete branca nas areias das praias. Esses sim não são da tribo oceânica.

sexta-feira, novembro 26, 2010

Gozado isso. Não estou atualizando o blog e mesmo assim, esses dias, cheguei a 10 mil acessos nos últimos 30 dias. Devem ser as matérias antigas. Mas confesso que a mídia eletrônica, por mais atraente que possa parecer, não é muito minha praia. Observei que a maioria dos que acessam este blog fica ali uns 30 segundos. Isso mesmo: trinta segundos. O que um sujeito lê em 30 segundos? Então é melhor nem me acessar.
Sinal dos tempos. Tudo muito superficial, rápido, descartável.
Só agora recebi a minha primeira parcela do Google, dos acessos ás publicidades. Em anos e anos de blog (acho que comecei em 2006) consegui faturar esplendorosos 230 reais. E olhe que demorou. Bom, pelo menos me pagaram. Eu já achava que teria que dar queixa.
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Estou na biblioteca da PUC.
É sexta-feira e está tudo calmo. Uso essa estrutura toda, que é realmente invejável. Tem pouca gente hoje. Choveu durante o dia.
Passei na Famecos. O pessoal nãoe stava muito animado hoje. Deve ser o dia. Cafezinho a um real, só que é Nescafé. Daqui a pouco mais de um mês isso tudo vai estar ás moscas, a biblioteca começará o seu horário de verão, o que é sempre ruim.
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Verão, pra mim, não é das melhores coisas. Já gostei do verão, ou pensava que gostava. Hoje sou mais o inverno. Verão não é o mundo real. Além do calor infernal desta cidade de Porto Alegre, tem aquelas coisas que a gente bem sabe, todo ano: Big Broder na tevê, carnaval, mosquito, mosca, barato, suor, moleza, noites de insonia.
A idéia é ir para a beira do Guaíba pelo menos alguns dias. Quem conhece, sabe: o Guaíba é um rio bom (não me digam que é lago), manso, de águas quentinhas, onde a gente pode nadar em paz. Está despoluído do Belém Novo pra prás, o que já é alguma coisa.
Há tempos não nado. Incrível isso, já que adoro água, adoro nadar. Este verão vai ser o verão em que vou me reencontrar com a água, depois de tanto tempo.
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Acho que vou começar a usar esse espaço
pra escrever as minhas besteiras pessoais. Não custa nada, nem sei quem é que vai me ler. Mas alguém vai ler, lá em Pindamonhangaba.
A propósito: São Paulo é, disparado, o local que mais acessa o Conselheiro. Em segundo vem o Rio de Janeiro e em terceiro Porto Alegre.
Hoje andei procurando velhos amigos no Google, ex-amigos talvez. Que bom que eles me esqueceram, assim não tenho débito alguma. Aqui proceis.
É bom ser esquecido, dá um estímulo e tanto. E, nos grandes incêndio, a primeira coisa que queima é o livro de "contas a pagar".
Não sei porque disse isso. Ninguém me deve, pelo contrário. Mas acho a frase engraçada, me faz rir.
"Me leva aos paroxismos da hilariedades, faz-me rir a bandeiras despregadas". Também li essa frase em um jornal antigo, dos anos quarenta.
Naquele tempo eles chamavam todo mundo de "bom homem". E hospital era nosocômio. Deficiente mental era "retardado mental".
A gente se desacostuma dessas expressões, que até chocam.
Retardado mental é o dono de um bar que conheço. Disse pra ele que estava completando 89 anos e ele me olhou sério e disse: "E tu é um mentiroso".
Brasileiro não entende ironia, nem a mais primária. Acho que foi o Nelson Rodrigues que disse isso. O povão, com certeza, não entende ironia, nenhuma ironia. Então a gente tem que tomar cuidado.
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Uma amiga - cujo blog acessei - anda escrevendo a vida dela. Mora lá em uma praia do Nordeste, já viajou o mundo, tem muitas histórias, lê pra caramba, é dona de um sebo na beira da praia, muito badalado e que até já foi matéria do Fantástico. Uma celebridade local, a moça. lembro dela uns quinze anos atrás, ou mais. Irmã de uma outra ex-amiga, que agora ganha uma bela grana com negócio de tecelagem.
Pois é. A moça lê pra caramba mas escreve mal pra burro. Vai ver que é o estilo, só pode ser. Ou estava chapada e vomitou tudo na tela, sem cuidar do português.
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A gente vai ficando velho e debochado. E nostálgico também. Mas não vale a pena - a nostalgia, bem entendido.
O ano tá acabando e acho que o outro deve ser melhor. Já enfrentei anos piores que este que está acabando. Me lembro quando estava na cama, com oito parafusos no tornozelo, inútil, só vendo tevê e tendo que andar de muletas. Até hoje me sinto solidário a todos os homens e mulheres de muleta do mundo.
Como disse Kafka (estou meio erudito hoje): a religião é a muleta das almas paralíticas.
Ah, como me invoco com os que dizem "papai do céu"! Prefiro os que tiram ranho do nariz e os que chupam os dentes depois das refeições.