segunda-feira, junho 30, 2008

Quem quiser fumar, que se fume! (2)

Bogart: não largava o cigarro, nem nos filmes, nem na vida pessoal.


Quando você pára de fumar as 48 horas iniciais são, por assim dizer, de chapação: a mente se torna diferente, as mãos ficam levemente trêmulas, o humor irritadiço (o sujeito pode, inclusive, se tornar violento e explosivo) e, sobretudo, bate uma fome canina, ao mesmo tempo em que o olfato se aguça de uma forma incrível. Sente-se o cheiro de tudo, os cheiros que você não sentia antes, incluindo aí o do próprio cigarro. Ontem, na rua, senti, a 50 metros, o cheiro da fumaça do cigarro. Apertei o passo para fazer a confirmação, e lá estava uma mulher com um deles entre os dedos - aquele cheiro era daquele cigarro.
Também as ruas ganham odores. Ruas que antes eram inodoras, de repente passam a cheirar a coisas bem prosaicos, como o odor de plantas, de umidade, de cigarro, de urina, de mofo, de mil coisas. A nossa própria casa também, e nem sempre são odores agradáveis. Você sente o cheiro do cigarro entranhado em tudo - no travesseiro, nas roupas, na toalha.
Aos poucos porém, passando essa fase crítica, o olfato parece que volta ao normal, assim como o apetite, extraordinariamente aguçado nos dias iniciais de abstinência. Claro, falo por experiência pessoal, já que sou veterano em parar de fumar - já parei seis meses, dois meses e meio, um mês, uma semana. Os sintomas sempre foram os mesmos. Uma coisa eu notei: ao contrário do que muita gente diz, você não fica o tempo todo só "pensando naquilo". Dá até para esquecer do cigarro.
Já o apetite é um capítulo à parte. Quem vai parar com o tabaco, e está em casa, deve estocar bastante coisas nas prateleiras dos armários e na geladeira. Não só doces como salgados, azedos, amargos, qualquer coisa comestível - frutas também valem. Haja comida, meus amigos! É o fenômeno da compensação, acredito.
Ontem comi tantas coisas, e tão diferentes, que quase tive uma diarréia. Banana, doce de uva, abobrinha, chocolate, doce de côco, laranja, manga, macarrão, salada de tomate e cebola, guaraná, galinha assada, carne assada - a lista é grande. Um chiclete na boca ajuda muito, não esqueçam disso.
Da mesma forma, é altamente recomendável, nesses dias, não tomar café e ne nem beber nada de álcool. O café é o maior amigo e compadre do cigarro, os dois são unha e carne, nossa memória, nossos cromossomos, sei lá, já identificam a simbiose entre um e outro, e, ao primeiro gole, vem a vontade de puxar um cigarrinho. Além disso a pessoa fica agitada, o que é sempre ruim nessa fase em que é preciso estar calmo e se dominando.
O gozado é que só me tornei fumante aos 30 anos, o que não deixa de ser um contrasenso e, obviamente, uma burrice. Lembro bem da cena: estava para fora, em uma Estação da Embrapa, e, sei lá porque, pedi um cigarro a um pesquisador. Pela primeira vez na vida traguei - já havia fumado de mentirinha antes. Traguei - e para ver como essa droga é forte - senti imediatamente uma tontura, tanto que me agachei, temendo, quem sabe, cair.
O pior é que gostei da tonturinha - e filei outro do sujeito. Traguei de novo. No outro dia, comprei alguns avultos, e fumei tragando. No segundo dia comprei uma carteira de Free Box - marca que fumei por muitos anos. Por ser um cigarro fraco, cheguei, certa época, a consumir dois maços por dia - 40 cigarros.
Conta-se que Yul Brinner (não preciso explicar quem é, não é mesmo?) fumava quatro maços por dia, o mesmo acontecendo com Humphrey Bogart, que fumava ainda mais, e bebia o dobro do que fumava.
Sinceramente, não sei como conseguiam - não dá tempo, nas horas em que estamos acordados, pra fumar tanto. Deve ser a história de acender um no toco do outro.
Bom, mas chega disso agora. O tempo está úmido no Jardim Botânico, de cara fechado, cinzento, bem segunda-feira mesmo. (Conselheiro X.)

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