sábado, outubro 25, 2008

Paulão, dono de bar, até pescou no arroio Dilúvio

Bar e armazém do Paulão, na Valparaíso, esquina com a Salvador França: um dos mais antigos em atividade.Paulo Soares dos Santos, 65 anos, o Paulão, faz parte da história do Jardim Botânico – incluindo aí a própria Fundação Zoobotânica, onde trabalhou como vigia por muitos anos, antes de se tornar comerciante. Dono de um tradicional bar e armazém na rua Vaparaíso, bem na esquina com a Salvador França, hoje um local movimentadíssimo e barulhento, ele pegou o Botânico em uma fase bem diferente, tanto que trabalhou no bairro como carroceiro, vendendo verduras de porta em porta.Tempos bem diferentes, reconhece ele, escorado no balcão. “Cheguei aqui com cinco anos de idade, vindo do interior de Viamão. Meus pais vieram de carreta e fomos morar inicialmente na Barão do Amazonas, depois nos mudamos para a “travessa municipal”, na antiga Vila Russa”, recorda. Dos anos cinqüenta, quando era menino, lembra do armazém do Caboclo, na Barão, do Armazém Parafuso, onde hoje está o Fome Zero (“O dono tinha esse apelido, vendia querosene, alface, queijo), da Dona Versa, na própria Valparaís, o Estrela Dalva, na rua Dona Inocência.
CHÃO BATIDO - As famílias, naqueles anos cinqüenta, podiam ser citadas pelos nomes, os Correia, os Lucena, os Santos, os Pieretti, os Maraschin, entre tantas outras. Todos se conheciam e quase todos freqüentavam os mesmos locais – o Clube Amazonas, o Leal Santos, o Clube São Pedro, os bailes de carnaval, o pingue-pongue, a cancha de bocha, as pescarias no arroio Dilúvio – então um curso de águas limpas onde podia-se tomar banho e fazer piqueniques às suas margens. A gurizada também costumava caçar na mata onde hoje está o a Fundação Jardim Botânico, subindo pela hoje avenida Tarso Dutra, que naquela época não existia. “Para subir para Petrópolis tinha que ir pela Barão, ou pela Cristiano Fischer, era tudo de chão batido.Nesse bairro, por assim dizer, quase rural, as chácaras predominavam, especialmente as que plantavam agrião vendido depois no Mercado Público. “Ia-se de carroça”, lembra Paulão.Havia ainda várias olarias que fabricavam tijolos – uma das quais perto de onde hoje é o DEEPS, na Ipiranga, e outras mais adiante, para os lados da Cristiano Fischer, onde algumas famílias criavam porcos para a venda, sem contar as galinhas.“Se comprava lenha e querosene na Dona Versa e no Caboclo. Todo mundo tinha fogão à lenha. Tinha também uma fábrica de papelão na Ipiranga, onde hoje é a concessionário Peugeot. Lembro do doutor Francisco, que era o médico, atendia em casa, ele morava na Bento, se não me engano. O pessoal daqui ia muito para a avenida Bento Gonçalves, fazer compras. Lá já existiam muitas ferragens, o Tico-Tico (restaurante), e, do outro lado, a churrascaria aquele, da dona Erci e marido, a “Poletto”.
PESCARIAS E CAÇADAS – A avenida Ipiranga – hoje uma das mais movimentadas da cidade – não existia, por assim dizer. “Havia uma ponte de madeira, onde é aqui a Salvador França, e a gente pescava embaixo. Do outro lado havia uma vila”. Outra lembrança bem presente daqueles tempos era a fábrica de carroça do seu Lúcio, na rua Guilherme Alves, defronte à atual igreja de São Luís. “Eles faziam carroças, arreios, alugavam carroças também, e havia uma ferraria do lado, para ferrar os cavalos. Ali tinha movimento direto, muitas carroças paradas, cavalos.”Nesse tempo, o esgoto era recolhido pelos famosos “cubeiros”, que faziam parte de um sistema municipal e arcaico de coleta in natura do esgoto cloacal: colocava-se recipientes em forma de cubos embaixo das privadas , ou “patentes”, que depois, quando cheios, eram lacrados e recolhidos pelos “cubeiros”, que vinham em caminhões, em datas marcadas. “O cheiro era horrível, às vezes aquilo tudo derramava”, diverte-se hoje Paulão.“Quem não tinha esse cubos tinha que apelar para a velha casinha, com o buraco da fossa, fora da residência”. Quanto ao lixo doméstico, como não havia recolhimento diário, quase sempre era queimado ou enterrado.
Nesse tempos existia o famoso cabaré Castelo Branco, na dona Inocência, e depois o Casa Rosada, na La Plata. “O Castelo Branco tinha muitos quartos, lembro que ia lá, vender verduras e frutas para as mulheres”, afirma Paulo. Depois de fechado, o cabaré serviu como posto de policiamento da Brigada Militar e atualmente é uma espécie de pensão, com aluguel de peças. O único conjunto habitacional do bairro era a Vila dos Bancários, na Barão do Amazonas (que territorialmente, já é Petrópolis), o empreendimento mais “luxuoso” de então e que, durante anos, deu nome a uma linha de ônibus. Depois de quase trinta anos como dono de bar, Paulo Soares dos Santos está prestes a sossegar: vendeu o seu negócio e a sua propriedade, os filhos se dedicam a outras atividades, e talvez seja a hora de parar – ou pelo menos, de trabalhar menos, “só na manha”.
TRANQUILIDADE - Paulão abriu o seu bar e armazém em 1985, do outro lado da Salvador França, onde “bombava gente aos finais de semana”. Nos anos noventa veio para o seu atual endereço, já como proprietário, de onde não mais saiu e fez a sua clientela. Nada mau para quem começou a trabalhar em vendas com sete anos de idade, foi carroceiro, verdureiro, porteiro de edifício, vigia e funcionário de ferro-velho.“Para mim o Jardim Botânico é um dos melhores bairros de Porto Alegre. Acho tudo bom, não tem coisas ruins. Aqui namorei, noivei, casei, tive filhos, netos”, resume ele.

Um comentário:

Baal'raam disse...

boa esta história, me fez relembrar os tempos antigos. Mas cadê a foto do Paulao? abç